A
inserção da moderna tecnologia do sensoriamento remoto nos
estudos de paisagem é, ainda, uma prática recente no campo
da Geografia. Na década
de 1970, surgem discussões esparsas, mas consistentes sobre o assunto,
tal como a apresentada por Jean Tricart, em 1979, no seu artigo “Paysage
et Ecologie”, alertando sobre o surgimento do sensoriamento remoto
como uma ferramenta inovadora e de grande importância para os estudos
geográficos, sobretudo, para os de paisagem. Na
época, o sensoriamento remoto estava, ainda, na sua infância,
mas já apareciam experiências pioneiras com fotos aéreas,
imagens de radar e, por último, com imagens de satélite LANDSAT,
que demonstravam o enorme potencial a ser explorado em trabalhos de mapeamentos,
levantamentos e monitoramento dos recursos ambientais, com facilidades
muito superiores que com as técnicas tradicionais, apenas. Tricart
tratava, portanto, de um sensoriamento remoto ainda pouco conhecido, restrito
ao meio científico de alguns países mais desenvolvidos e
distante do domínio público. E
destacou dois trabalhos importantes ao nível de inventários,
elaborados a partir da utilização do sensoriamento remoto: 1)
um desenvolvido na Austrália pela Commonwealth Scientific and
Industrial Research Organisation (CSIRO)[1],
fazendo um completo levantamento dos recursos ambientais daquele país
com a utilização de aerofotos; e 2)
um outro, desenvolvido no Brasil pelo Projeto RADAMBRASIL[2],
confrontando informações de imagens de radar[3],
apoiado em bibliografia e controlado por trabalhos de campo, buscando nos
domínios vegetação, geomorfologia, geologia e solos,
fazer um verdadeiro “inventário das possibilidades minerais,
das restrições de desenvolvimento e ao equipamento, dos recursos
oferecidos pelos solos” (TRICART, 1979).
O
autor abriu uma ampla discussão centrada na questão metodológica
da utilização dos produtos do sensoriamento remoto. Isto
decorreu da preocupação de Tricart com relação
à euforia causada pelas facilidades de tratamentos numéricos,
o que estava levando muitos pesquisadores a eliminarem, por completo, as
técnicas tradicionais, como os trabalhos de campo.
Ora,
o tratamento numérico das informações registradas
pelos produtos do sensoriamento remoto, por si só, como faziam alguns,
culminaria, certamente, em trabalhos pouco confiáveis. As
checagens de campo, constituem uma etapa imprescindível dos estudos
e nenhum modelo numérico consegue substituí-las por completo. Na
verdade, os produtos do sensoriamento remoto são apenas novas e
poderosas ferramentas facilitadoras dos estudos da superfície terrestre. É
dessa forma que eles devem ser encarados.
Passadas
duas décadas desde que Tricart prenunciou as potencialidades do
sensoriamento remoto para os estudos geográficos, percebe-se que
este atingiu um grau de popularização bastante elevado. Os
grandes e cada vez mais rápidos avanços tecnológicos
têm, aos poucos, propiciado uma redução nos custos
e permitido, assim, um acesso crescente de usuários. A
inserção do sensoriamento remoto entre as disciplinas básicas
das estruturas curriculares dos cursos de graduação e pós-graduação
em Geografia, assim como em outras áreas que trabalham com análise
espacial e planejamento, teve um papel importante na “academicização”
e popularização deste novo campo de pesquisa e trabalho. Cada
vez mais, inúmeras pesquisas acadêmicas utilizam o sensoriamento
remoto ou seus produtos, como temas e/ou instrumentos de trabalho. Além
disso, os produtos do sensoriamento remoto constituem material imprescindível
por parte do Estado, que o tem utilizado como instrumento de controle e
gerenciamento territorial.
Convém
destacar que, na atualidade, as imagens de satélite assumiram praticamente
toda importância dentro do sensoriamento remoto, especificamente
para os estudos de cunho geográfico, ainda que considere-se o papel
desempenhado pelas imagens de radar[4]
e pelas fotografias aéreas[5]. Quando
se refere, hoje, em sensoriamento remoto, associa-se diretamente às
imagens de satélites. Ressalte-se
que é sobre elas que procurar-se-á fazer, nas próximas
linhas, uma apresentação acerca de seu papel para os estudos
de paisagem.
Convém
destacar, em tempo, que concomitante e paralelo à evolução
tecnológica e à popularização do sensoriamento
remoto, teve-se, igualmente, uma evolução e popularização
muito grande da informática, tornando os produtos do sensoriamento
remoto mais fáceis de se manusear e com maiores possibilidades de
se explorar suas potencialidades. O
desenvolvimento de hardwares e softwares de tratamento digital
de imagens de satélites, aos poucos eliminou os trabalhos com imagens
analógicas. Trocou-se
a análise visual pura e simples com base nas tonalidades, rugosidades
e outros atributos das imagens impressas em papel, por tratamentos on
screen muito mais completos e complexos, que buscam, através
dos dados digitalmente registrados, explorar as informações,
até se chegar a um nível de tratamento apropriado para as
interpretações desejadas, seja visualmente ou via computador.
A
geração pelo mercado de sofisticados e diversificados equipamentos
de tratamento e análise de imagens de satélite, tem possibilitado
explorar ao máximo as informações nelas registradas. Todavia,
a associação das informações de laboratório
com as de campo continua sendo – e não o deixará de ser –,
a resposta mais eficaz para as indagações.
Pequeno
tour pelos sistemas satélites LANDSAT e SPOT
A
tecnologia dos satélites foi concebida na década de 1960
pelo Department of the Interior dos Estados Unidos e posteriormente,
levado adiante pela National Aeronautics Space Administration (NASA)
e com a parceria, a partir da década de 1970, do U.S. Geological
Survey (USGS), arquivando dados e distribuindo produtos. Em
julho de 1972 é lançado o primeiro (LANDSAT 1)[6]
de uma série de satélites projetados para produzir repetitivas
coberturas globais das massas terrestres. É
a origem da família LANDSAT, que teve outros satélites colocados
em órbita em 1975, 1978, 1982, 1984 e 1993 (LANDSAT 2, 3, 4, 5 e
6, respectivamente). Em abril
de 1999, foi lançado o LANDSAT 7, com 6 bandas multiespectrais[7]
de resolução 30 x 30 m – a mesma que os satélites
anteriores –, uma térmica de 60 x 60 m e uma banda pancromática[8]
de resolução 15 x 15 m. Na
atualidade, o Programa LANDSAT, como definido pelo Congresso Norte-Americano
em 1992 e por emenda presidencial de 1994, é gerenciado cooperativamente
pela NASA, pela National Oceanic and Atmospheric Administration
(NOAA) e pelo USGS.
O
programa SPOT (Satellite Pour l’Observation de la Terre) surgiu
na década de 1980 projetado pelo Centre National d’Etudes Spatiales
(CNES), da França, com a participação da Suécia
e da Bélgica. O sistema
SPOT teve seu primeiro lançamento de satélite (SPOT 1) em
fevereiro de 1986. Outros
três satélites foram lançados em 1990, 1993 e 1998
(SPOT 2, 3 e 4, respectivamente), porém um deles – o SPOT 3 – foi
danificado e encontra-se fora de operação. O
SPOT 5, está em construção e tem sua previsão
de lançamento para o ano de 2002, com inúmeras inovações. Pelas
suas características – com destaque para a sua alta resolução
espacial, em sua banda pancromática (10 x 10 m) e a produção
de pares estereoscópicos[9]
– o sistema SPOT permite reunir dados servindo a diferentes aplicações: cartografia,
agricultura, meio ambiente, ocupação do solo/cobertura vegetal,
desertificação, zonas urbanas etc.
Os
sistemas LANDSAT e SPOT são classificados como satélites
de alta resolução, próprios para estudos detalhados
da superfície terrestre. São
os mais conhecidos e utilizados para estudos geográficos do território
brasileiro. Além desses,
existe uma série de outros sistemas satélites estacionários
ou gravitacionais em torno do Planeta Terra, registrando dados atmosféricos,
hidrológicos e da superfície terrestre, além dos satélites
de telecomunicações.
O
Brasil, na tentativa de entrar para o seleto grupo de países com
tecnologia de satélites, lançou em 14 de outubro de 1999,
cooperativamente com a China, o primeiro de uma pretendida série
de satélites de rastreamento contínuo da superfície
terrestre. É o China-Brazil
Earth Resource Sattelite (CBERS-1), desenvolvido com parceria tecnológica
do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e da Chinese Academy
of Space Tecnology (CAST). A
série CBERS tem como principais objetivos o monitoramento de recursos
terrestres brasileiros e chineses e o monitoramento das condições
de uso do solo, urbanização, desmatamento, queimadas e outros
fatores associados à ação antrópica, pretendendo
proporcionar certa autonomia na tecnologia de satélites para ambos. São
sistemas satélites únicos, uma vez que carregam a bordo sensores
que combinam resoluções temporais e espaciais diversas, adequadas
às necessidades e demandas dos cooperados[10].
Juntamente com o CBERS-1, foi lançado o Satélite de Aplicações
Científicas (SACI), exclusivamente brasileiro, que tem como base
a tecnologia de vanguarda dos microssatélites.
As
imagens de satélite e os estudos de paisagem
Para
os estudos geográficos, o uso dos produtos do sensoriamento remoto,
com toda sua facilidade de manuseio, resultou em extraordinários
avanços científicos que na sua maioria deram origem a importantes
informações sobre a superfície do planeta, bem como
da atmosfera. Neste último
caso, quando se trata dos satélites meteorológicos, que acompanham
o movimento das massas de ar e fornecem várias vezes ao dia os possíveis
acontecimentos atmosféricos das horas ou dias seguintes.
A
principal novidade advinda da tecnologia das imagens de satélites
é que os sensores registram as energias refletidas e/ou emitidas
pelos objetos da superfície terrestre, nos seus diferentes comprimentos
de ondas, dentro de espectro eletromagnético. Isto
significa, que os sensores são capazes de registrar informações
muito superiores, quantitativa e qualitativamente, que as limitadas informações
obtidas pelo olho humano, que capta ondas apenas na faixa do visível. Cada
objeto, de acordo com suas características, reflete e emite ondas
eletromagnéticas em diferentes comprimentos, e isso resultará
em registros diferenciados numa imagem de satélite. Em
decorrência deste fato, em cada canal ou banda, o mesmo objeto será
registrado com informações diferentes. Este
é um dos segredos que permite diferenciar os objetos uns dos outros
na imagem de satélite, via suas tonalidades. É
a partir dessa peculiaridade que se identifica qual canal é o mais
adequado para se efetuar os estudos pretendidos, bem como, torna-se possível
a criação de alguns padrões de análise e interpretação
para as imagens. Diga-se,
en passant que, classes de objetos diferentes, como vegetais, corpos
hídricos, formas de relevo e outros, apresentam melhores respostas
em determinados canais. ROSA
(1995), atenta que, para se escolher os canais mais propícios aos
trabalho que se pretende realizar, deve-se considerar o coeficiente de
correlação entre as bandas espectrais, já que alguns
canais sugerem informações redundantes. Neste
caso, deve-se escolher aquelas bandas que contenham a maior quantidade
de informações úteis, ou seja, as bandas de menores
correlações entre si.
Vale
destacar que, grande parte das informações dos objetos da
superfície terrestre refletem ou emitem radiações
na banda do infra-vermelho, às quais o olho humano é incapaz
de captar. É o caso
da vegetação, que muitas informações sobre
as suas condições resultam em ondas refletidas nesta faixa
do espectro eletromagnético.
O
satélite mede a intensidade da energia refletida ou emitida e a
registra como um número com valores que variam de 0 a 255. Estes
valores são traduzidos em tonalidades de cores (256 tons) que são
mostrados na tela de um computador ou em imagens impressas em papel, passíveis,
então, de serem vistas e interpretadas pelo olho humano. É
a partir desses valores que as composições coloridas são
produzidas. As composições coloridas resultam da combinação
de dois ou três canais diferentes, atribuindo a cada um deles as
cores básicas vermelho (R), verde (G) e azul (B). Ao
se atribuir as cores básicas aos seus respectivos canais de registro,
ter-se-á produzido uma imagem em cores verdadeiras, desde que elas
indiquem as cores verdadeiras dos objetos tal como a vegetação
em verde e a água em azul. A
mistura de bandas da faixa do visível (vermelho, verde e azul) com
bandas do infra-vermelho, permite a produção de imagens denominadas
de falsa-cor.
Outra
importante inovação trazida pelas imagens de satélite,
para os estudos geográficos, é a possibilidade da produção
de informações numa escala têmporo-espacial sem precedentes. A
repetitividade automática de registro de informações
da superfície com uma escala temporal reduzida[11],
permite confrontar situações diferentes e sincrônicas
sobre os fenômenos espaciais, possibilitando acompanhar a evolução
dos mesmos, temporal e espacialmente.
Para
a Cartografia, que sempre conviveu com o incômodo da desatualização
constante dos mapas, o rápido desenvolvimento tecnológico
do sensoriamento remoto, assim como o exponencial crescimento de suas aplicações,
contribuíram para o aprimoramento das informações,
ao ponto de se admitir que se está vivendo uma verdadeira revolução. A
representação de fenômenos dinâmicos no tempo
e no espaço, podem, então, ser monitorados com intervalos
de tempo bastante reduzidos. Para
isto, surgiram os bancos de dados digitais, capazes de armazenar quantidades
imensas de dados cartográficos e geográficos. Criou-se,
ao mesmo tempo, a oportunidade de efetuar-se estudos comparativos de períodos
diferentes sobre um determinado território com muita fidelidade,
além da permitir a reconstrução da história
da dinâmica dos fenômenos no espaço a qualquer tempo,
desde o início dos registros satelitares[12].
Além
da Cartografia convencional, seja analógica ou digital, os satélites,
juntamente com os avanços da informática, deram origem a
um outro tipo de representação da superfície terrestre,
conhecido como Modelo Numérico do Terreno (MNT), capaz de gerar
mapas temáticos em três dimensões, a partir de pares
estereoscópicos.
Isto
tudo implica, potencialmente, em instrumentos de maior controle dos fenômenos
espaciais, sejam de ordem natural ou antropogênicos. Com
o acesso à imagens de satélites, pode-se, por exemplo, estimar
a produção agrícola, monitorar os remanescentes florestais,
monitorar a temperatura e a salinidade dos mares e oceanos, enfim, uma
infinidade de possibilidades de estudos, com destaque para os programas
de monitoramento ambiental.
Todavia,
há muita coisa ainda para ser melhor explorada, a partir da riqueza
das informações fornecidas pelas imagens de satélites,
como a manipulação dos dados matemáticos que estão
contidos no seu processo de registro. Como
destacado anteriormente, cada tonalidade de cor registrada por cada canal,
tem um valor numérico, o que, teoricamente, implicaria em objetos
ou classes de objetos (vegetação, agricultura, solo nu etc.)
de mesmas propriedades ter um mesmo valor numérico. Com
efeito, nem sempre isto acontece, o que dificulta a criação
de uma matriz que sirva para a exploração das informações
de qualquer imagem. O que
se tem, na verdade, é uma diferenciação bastante grande
nas informações registradas por um mesmo tipo de objeto,
dependendo do seu estado no momento do registro. Quando
se trata de agricultura, por exemplo, observa-se que o mesmo tipo de cultura
apresenta variações significativas, resultante de alguns
fatores como o seu estágio de crescimento, a umidade, a densidade
etc. Nestes termos, seguindo
o exemplo citado, pode-se enumerar algumas questões sobre os quais
o intérprete de imagens de satélite deve estar atento: data/estação
de registro da imagem, fenômenos atmosféricos no dia do registro
ou em dias anteriores, período de safra ou entre-safra, tipos de
culturas produzidas costumeiramente na região, formato das porções
do mosaico que é a imagem entre outras. São
algumas questões que podem contribuir para uma interpretação
mais segura e acurada.
Para
os estudos de paisagem, as imagens de satélite, como prenunciado
em 1979 por Jean Tricart, são ferramentas que contribuíram
muito para o próprio avanço da concepção do
termo “paisagem” dentro da Geografia. Muito
discutida e abandonada por um longo período, pela sua carga de subjetividade,
a noção de paisagem retorna à Geografia, juntamente
com a noção de geossistema, exercendo um papel de conceito
integrador das dicotomias geográficas. Designada
por Georges Bertrand, em 1968, como uma determinada porção
do espaço, onde a combinação dinâmica de elementos
físicos, biológicos e antrópicos reagem-se dialeticamente
entre si, formando um conjunto único e indissociável, em
perpétua evolução, a paisagem passa a constituir uma
categoria de análise que abarca tanto os fenômenos e elementos
naturais, quanto os sócio-econômicos[13]. E
os resultados dessa interação estão expressos na sua
fisionomia.
As
imagens de diferentes satélites e bandas constituem a melhor síntese
global da paisagem. Isto
é, elas representam o resultado combinado de todos os elementos
registrados em forma digital, criando muitas possibilidades para se estudar
a paisagem. A combinação
de bandas diferentes, através de seu geoprocessamento, realça
ainda mais essa síntese global e traz resultados fenomenais para
uma boa interpretação, resultando em mais eficiência
e rapidez nos estudos. Deste
modo, para os estudos de paisagem, é evidente que as imagens de
satélites aparecem exercendo uma importância indiscutível. A
compreensão da organização espacial e do funcionamento
da paisagem depende de uma apreensão integrada dos elementos, estejam
eles perceptíveis ou não aos olhos. Neste
ponto, os satélites preenchem a lacuna que faltava. O
resto, depende do olho humano, centrados na imagens e, reafirma-se, no
campo. Para tanto, DIAS (1998),
alerta que “é necessário uma boa base teórica,
tanto a respeito do comportamento dos alvos e a resposta emitida por eles
no processo de registro de informações digitais, quanto do
comportamento da paisagem como entidade resultante da integração
de elementos”. A paisagem,
como definida por Bertrand, é dinâmica e global. E
desvendar suas complexidades, envolve, evidentemente, uma visão
de mesma natureza.
As
imagens de satélite e os Sistemas de Informações Geográficas
(SIG’s)
O
contingente cada vez maior de pessoas (pesquisadores ou técnicos)
com acesso aos produtos do sensoriamento remoto tem contribuído
muito para o desenvolvimento dos estudos com imagens de satélites,
ao ponto destas constituírem o principal meio usado para mapeamentos
e monitoramento dos fenômenos espaciais, tanto os de caráter
antrópico, quanto natural.
O
desenvolvimento do Personal Computer (PC)[14]
e de softwares de tratamento de imagens de satélite cada
vez mais completos, levou grande parte dos geógrafos a migrarem
para o estudo do espaço a partir da tela de um computador, antes
mesmo de ter um contato mais íntimo com a área de estudo. Primeiro,
conhece-se virtualmente a área, explorando todas as informações
possíveis de se lograr. Após
essa etapa, desloca-se à área propriamente dita para o processo
de checagem ou conferência de informações, quantas
vezes forem necessárias.
Uma
imagem de satélite, após seu registro pelo sensor, passa
por conjunto de técnicas de tratamento, até chegar a seu
ponto de interpretação e análise, seja ele analógico
ou digital. Este conjunto de
técnicas denomina-se geoprocessamento, que constitui de etapas que
vão desde a tomada da imagem “crua”, ainda sem nenhum tipo de tratamento,
até se constituir num produto pronto para se extrair informações. As
principais etapas do geoprocessamento resumem-se em: correções
geométricas e radiométricas, realce de tonalidades, composições
coloridas, georreferenciamento, classificação, entre outras,
assistidas, todas, por computador.
Diante
da disponibilidade periódica de dados sobre a superfície
terrestre, favorecendo a atualização constante de informações
geográficas, cartografáveis ou não, de uma dada porção
do espaço, os avanços deram origem também aos chamados
Sistemas de Informações Geográficas (SIG’s)[15]. O
SIG é um outro sistema de manipulação de dados geográficos
surgido com o desenvolvimento dos hardwares e softwares destinados
ao geoprocessamento. Estes
constituem a mais moderna forma de armazenar informações
geográficas de um modo sistemático, de acesso imediato e
de fácil manipulação e atualização em
um único banco de dados. Um
SIG comporta, basicamente, dois bancos de dados: um
contendo informações geoespaciais descrevendo a posição
e a forma dos elementos no espaço e, um outro, descrevendo os atributos
e as qualidades desses elementos, este último, comportando informações
de caráter extremamente dinâmico, sendo necessário
constantes atualizações. Para
isto, o SIG dispõe de um poderoso componente chamado Sistema de
Manejo de Banco de Dados (Data Base Management System - DBMS), usado
para entrar, manipular e analisar dados. Pode-se
entrar com um questionamento ao SIG e obter uma resposta através
de análises, resumos e tabulações. Ao
mesmo tempo, tem-se a possibilidade de solicitar do banco de dados central
a visualização ou exibição de informações
solicitadas e produzir-se mapas, tabelas ou gráficos, passíveis
de serem impressos ou armazenados magneticamente.
Todas
essas possibilidades de análise e de cruzamentos de dados dentro
de um SIG, fazem dele um instrumento muito poderoso para a tomada de decisões. Pode-se
montar um SIG tanto de uma propriedade rural, quanto de um município,
região ou país e nele inserir e/ou extrair informações
importantes que favoreçam seu gerenciamento. Muitas
prefeituras brasileiras dispõem de um SIG, o que tem facilitado
a administração, bem como a fiscalização e
um conseqüente aumento da arrecadação.
Uma
experiência de estudo de paisagem a partir de imagens de satélite
Uma
experiência pessoal utilizando imagens de satélite para estudo
de paisagem foi feita na região da Serra da Bodoquena, no Estado
de Mato Grosso do Sul, especificamente no entorno da cidade de Bonito[16],
compreendendo uma quadrícula de 4,9 km2. A
região sustenta características paisagísticas bastante
peculiares, uma vez que está numa área de transições
geológicas, mas com predomínio de rochas carbonáticas,
que desenvolvem o fenômeno cárstico. A
diversidade litológica regional, foi responsável pela criação
de um mosaico paisagístico que traduz a interação
dos elementos abióticos e bióticos, refletidos na sua fisionomia
e na sua organização interna. Estas
peculiaridades – com destaque para a carstificação da paisagem
– implicam em cuidados especiais quando da exploração dos
seus recursos ambientais, o que supõe que a organização
espacial do agente antrópico deve se dar em função
das potencialidades paisagísticas, de acordo com as limitações
que esta sugere. Nestes termos,
utilizou-se imagens de satélite visando efetuar um estudo que determinasse
as potencialidades da paisagem.
Tomando-se
imagens de satélite de duas datas, separadas por um período
de 8 anos (1987 e 1995), conseguiu-se identificar as transformações
inseridas na paisagem pelo agente antrópico. Assessorado
por intensos trabalhos de campo, bem como pela coleta de informações
acerca das atividades econômicas responsáveis pela anexação
de novos territórios ao sistema produtivo, conseguiu-se avaliar
o grau de ocupação referente ao período analisado. Trabalhou-se
com o mesmo espaço, mas com duas paisagens distintas, construídas
historicamente. Considerando-se
o ritmo e o tipo de ocupação, o estudo revelou as tendências,
bem como os possíveis perigos a que a região estava sujeita.
Após
averiguar as transformações paisagísticas inseridas
no período, o estudo teve como objetivo principal delimitar a paisagem
– com base na imagem de 1995 – em unidades básicas, considerando-se,
principalmente, suas características internas, ou seja, além
das características fisionômicas – expressão externa
da paisagem –, tomou-se como critério, sua dinâmica global
em relação ao conjunto – sua expressão interna. Constatou-se
também que na estruturação paisagísticas, os
elementos da paisagem manifestam-se hierarquicamente, estando alguns deles
mais evidentes (vegetação, geomorfologia, geologia, atividade
antrópica etc.). Estes
elementos preponderantes são a base da evolução e
são, evidentemente, os mais aparentes no processo evolutivo. Deve-se
estar atento a este fato quando da delimitação das unidades
de paisagem.
Para
o caso específico da região alvo de estudo, a visualização
das imagens de satélite, por si só, trouxe informações
muito fiéis quanto às porções da paisagem. Ao
se confrontar as informações fornecidas pelas imagens, quanto
à fisionomia da paisagem, com aquelas apresentadas pelos mapas geológico,
geomorfológico, pedológico e hidrológico da área,
percebeu-se uma correspondência em grande medida. A
sobreposição de cada um destes mapas à imagem de satélite
demonstrou grande correlação entre si, refletindo que as
tonalidades (fisionomia) apresentadas pelas imagens de satélite
correspondem à estruturação interna das unidades de
paisagem. Dessa forma, partindo
das informações fornecidas pelos mapas e imagens de satélite
e mais visitas in loco, delimitou-se a área em 5 unidades
de paisagem.
Ao
final do trabalho, o que se pôde tomar como ponto de destaque foi
a fidelidade, assim como a facilidade proporcionada pelas imagens de satélite
na determinação de cada unidade de paisagem, pois, como descrito
anteriormente, estas refletem além da suas externalidades, também
suas internalidades, o que implica em uma quantidade de informações
muito maiores. Percebe-se que
as imagens de satélite realçam as unidades de paisagem. Quando
se vê a paisagem com os olhos humanos, capta-se apenas sua fisionomia
externa. As imagens de satélite
conseguem ir muito além disso, registrando informações
que ultrapassam os limites superficiais e visíveis.
Nestes
termos, a execução deste trabalho evidenciou que para os
estudos de paisagem, tanto ao nível de delimitações
elementares quanto àquelas mais profundas e detalhadas, as imagens
de satélites são ferramentas indiscutivelmente importantes.
Algumas
palavras finais
Os
estudos de paisagem, via produtos do sensoriamento remoto carecem de muitos
avanços e reflexões. No
caso do Brasil, com toda a sua diversidade paisagística, proporcionada
pela tropicalidade do clima, estas reflexões devem ser ainda mais
profundas. Não se pode
reduzir a uma simples transformação de imagens de satélite,
imagens de radar ou fotografias aéreas, em mapas temáticos,
prontos e acabados, estes apenas reproduzindo aqueles.
A
importância do sensoriamento remoto tende a crescer cada vez mais,
seja devido seu desenvolvimento tecnológico, seja pelo papel que
ele exerce na investigação da superfície terrestre
e da atmosfera. Seu objetivo
primeiro deve ser o de buscar sempre uma melhoria na relação
do homem com a natureza, pautado num conhecimento cada vez maior desta
última. O estudo da
paisagem pela paisagem pura e simplesmente, sem um valor prático,
que traga benefícios para esta relação, resulta, certamente,
em inutilidade.
O
sensoriamento remoto é uma ferramenta que deve fornecer dados e
informações visando estabelecer uma autêntica eqüidade
entre as potencialidades e a exploração e preservação
dos recursos ambientais. O
potencial que ele oferece tem que ser explorado para a resolução
dos problemas já instalados e, principalmente, para a previsão
e impedimento do surgimento de outros, similares ou não. O
que se tem sempre feito é muito mais resolver os problemas instalados
do que evitar que outros ocorram. Este
é um problema que será superado à medida que se encarar
o sensoriamento remoto como uma verdadeira arma de controle e gerenciamento
espacial efetivos.
Anexe-se,
em tempo, o fato de o mundo globalizado da atualidade, globalizar, igualmente,
os problemas, especialmente os de ordem ambiental, que só podem
ser resolvidos a partir do momento em que as fronteiras forem ignoradas. O
sensoriamento remoto possui um papel exclusivo neste processo, que vai
desde o dimensionamento dos problemas até o monitoramento dos efeitos
e das medidas que visem solucioná-los.
Referências
Bibliográficas
BERTRAND,
Georges. Paysage et géographie
physique globale: esquisse
méthodologique. Revue
Géographique des Pyrénées et du Sud-Ouest. Toulouse,
39 (3), 249-272, 1968.
DIAS,
Jailton. As potencialidades
paisagísticas de uma região cárstica: o
exemplo de Bonito, MS. Presidente
Prudente, 1998. Dissertação
(Mestrado em Geografia). Faculdade
de Ciências e Tecnologia. Universidade Estadual Paulista.
JOLY,
Fernand. A Cartografia. Trad.
Tânia Pellegrini. Campinas: Papirus,
1990.
ROSA,
Roberto. Introdução
ao Sensoriamento Remoto. 3ª
ed. Uberlândia: EDUFU,
1995.