CAPÍTULO IV - A ESTRUTURAÇÃO DA PAISAGEM DA REGIÃO DE BONITO
A estruturação da paisagem, resulta, de acordo com a concepção de BERTRAND (1972), de uma combinação dinâmica entre os elementos abióticos e bióticos, juntamente com a participação dos feitos do elemento antrópico. Neste caso, a fisionomia da paisagem expressa os fenômenos ocorrentes neste tripé de relação integrada. Destarte, a paisagem aparecerá como um verdadeiro mosaico, onde cada porção demonstra um sentido evolutivo, ou seja, cada porção define-se pelo tipo de relação nela estabelecida. Cada pedaço deste mosaico, corresponde ao que o autor chama de geofácies e geótopo, dentro de sua classificação taxocorológica.
Neste sentido, BERTRAND (1972), destaca a aparência fisionômica da paisagem como o elemento determinante na definição de unidades básicas, com vistas a sua cartografação, considerando-a uma síntese da integração entre os elementos. O autor denominou os elementos abióticos de potencial ecológico, englobado pelo clima, geomorfologia e hidrologia; os elementos bióticos congregam a exploração biológica do espaço, constituída, além dos vegetais e animais, pelo solo, considerado por ele como um elemento vivo; o terceiro constituinte do tripé é o homem, visto como agente explorador e transformador do espaço, denominando a relação dele com os dois outros elementos de ação antrópica. O conhecimento da integração de cada um destes elementos, permite avaliar o sentido evolutivo da paisagem, e a delimitar as suas "descontinuidades objetivas".
Embora BERTRAND (1972) tenha apresentado, no final da década de 60, uma aproximação da paisagem abordada integralmente, este tipo de estudo continua ainda no domínio da investigação, constituindo um esforço metodológico novo, que necessita de um aprofundamento teórico e prático. Tentar-se-á, neste trabalho aproximar-se um pouco dos níveis das discussões, na tentativa de se desenvolver uma concepção.
As informações concernentes à estruturação paisagística da área de estudo, foram coletadas, principalmente, nos trabalhos feitos pelo MME-Projeto RADAMBRASIL, visto o nível de detalhe com que estes foram executados.
4.1. O potencial ecológico da Região de Bonito
4.1.1. As bases estruturais e morfogenéticas
Para facilitar os estudos da área escolhida, visto a grande extensão do município de Bonito e da necessidade de adquirir mais que uma imagem de satélite, optou-se por fazer recorte de uma quadrícula, compreendida pelos paralelos de 21º 00 (7677 UTM) a 21º2130" S (7638 UTM) e os meridianos de 56º25 (560 UTM) a 56º4545" W (524 UTM). Em termos de extensão, a quadrícula compreende aproximadamente 1.420 km2, adentrando em sua porção sudoeste no município de Porto Murtinho. Chamar-se-á a área de Região de Bonito por compreender o entorno do núcleo urbano de mesmo nome.
A área escolhida, está assentada especificamente sobre o Planalto da Bodoquena, que bordeja o Pantanal Matogrossense na sua parte leste. Faz parte do grupo dos Planaltos Residuais do Alto Paraguai-Guaporé.
O Planalto da Bodoquena, ergue-se como um divisor de água entre a bacia do Rio Paraguai (oeste) e as sub-bacias do Apa (sul) e Miranda (leste). É um conjunto de relevos dispostos no sentido norte-sul, abrangendo como corpo principal a Serra da Bodoquena (vide Fig. 4.1.). A Serra da Bodoquena estende-se por aproximadamente 200 km, apresentando cerca de 65 km de largura. Trata-se de um extenso bloco de relevo de aspecto residual por se encontrar circundado pela Depressão do rio Paraguai (RADAMBRASIL, 1982).
As altimetrias médias predominam entre as cotas de 400 e 650 m, excepcionalmente ocorrendo áreas menores que 300 m e superior a 700 m. A quadrícula em estudo compreende altitudes que vão de 250 m até aproximadamente 750 m.
Observando-se o perfil do Mapa Geomorfológico do Projeto RADAMBRASIL, percebe-se claramente uma dissimetria no sentido leste-oeste na topografia da Serra da Bodoquena. Na porção ocidental, onde os relevos apresentam-se mais conservados, encontram-se escarpas abruptas, normalmente, ligadas a falhas tectônicas, enquanto a parte oriental assume uma superfície de aspecto rampeado.
As áreas mais dissecadas, revestidas de litologia calco-dolomítica, apresentam relevos bastante característicos, onde encontram-se os chamados "mogotes" (NICOD & SALOMOM, 1990), que são morros residuais essencialmente calcários de aspecto arredondado, quase sempre individualizados, não se percebendo uma transição altimétrica entre o fundo aplainado e o morro. LIMA (1992), justifica a forma arredondada dos "mogotes" da região da Bodoquena por serem eles constituídos por calcário calcítico, onde os processos químicos e a esfoliação esferoidal atuaram com maior vigor. Já aqueles de crista mais pontiagudas, associam-se aos calcários dolomíticos, que resistem mais aos processos corrosivos e erosivos, dada sua maior concentração de Mg2. Os "mogotes" formações típicas de regiões calcárias tropicais , aparecem recobertos por regolito, o que permite o desenvolvimento de vegetação exuberante; em alguns casos, eles aparecem desprovidos de rocha alterada, estando completa ou parcialmente nus.
A evolução cárstica permitiu o desenvolvimento na região de alguns poljes, que são típicas planícies cársticas de assoalho geralmente plano, de escoamento subterrâneo, limitado por vertentes abruptas, podendo ser sazonalmente inundado ou ainda apresentar lagoas intermitentes (KOHLER, 1988). Os poljés encontrados na região da Bodoquena são ainda pequenos e pouco evoluídos e as vertentes abruptas são representadas, especialmente, pelos mogotes. O mais expressivo, segundo LIMA (1992), é o da Fazenda São Geraldo, localizada no alto curso do Rio Formoso.
Geologicamente referindo-se, a região da Bodoquena apresenta-se muito falhada, fraturada e dobrada, atingindo várias formações, o que lhe confere feições muito complexas (vide Fig. 4.2.).
"É constituída principalmente por um sistema de falhas de empurrão, responsáveis pelo cavalgamento das litologias do Grupo Cuiabá por sobre as rochas do Grupo Corumbá e pelo espessamento local de suas camadas; ocorrem também, a elas associadas, pequenas falhas de caráter indiscriminado" (RADAMBRASIL, 1982).
O seu bloco mais compacto e representativo, a Serra da Bodoquena, compreende feições de relevos dobrados muito evoluídos e relevos cársticos.
Apesar das várias interpretações quanto ao ambiente de sedimentação das rochas do Grupo Cuiabá, o Projeto RADAMBRASIL concluiu que a litologia da área em epígrafe estabeleceu-se em ambiente marinho tectonicamente instável com períodos de quietude, ocasião em que se dava a precipitação carbonática. Contudo foram constatados que o xistos e filitos são os tipos litológicos predominantes, ocorrendo subordinadamente ardósias, metagrauvacas, metaconglomerados, calcários, mármores e quartzitos. É comum a presença de veios de quartzo, principalmente em meio aos filitos e xistos, originando verdadeiras cascalheiras.
As litologias do Grupo Corumbá constituem o suporte da imponente morraria da Serra da Bodoquena e é descrito pelo Projeto RADAMBRASIL como resultante da sedimentação numa bacia em subsidência, num ambiente sujeito, inicialmente, a influências glaciais, o que teria condicionado a deposição da Formação Puga, predominantemente clástica grosseira. Durante um período de calmaria tectônica, com um relevo já aplainado, ter-se-iam depositado os sedimentos pelíticos e carbonáticos da Formação Cerradinho, mais próximo da borda da bacia e, para o interior, a seqüência carbonatada da Formação Bocaina. Na área pesquisada, tem-se o afloramento apenas das formações Cerradinho, Bocaina e, localmente, da Formação Xaraiés, descritas a seguir.
Apesar de controvérsias quanto aos componentes da Formação Cerradinho, a escala de trabalho de Projeto RADAMBRASIL, permitiu verificar que existe uma predominância de rochas clásticas na base que, para o topo, vão se escasseando, dando lugar a litologias essencialmente carbonáticas. É constituída essencialmente por intercalações de arcóseos, arenitos, siltitos, argilitos, calcários, dolomitos, margas, ardósias, metargilitos, metassiltitos e folhelhos. A Formação Cerradinho, classificada pelo Projeto RADAMBRASIL como originária do Pré-Cambriano Superior, distribui-se por toda a área abrangida pela Serra da Bodoquena, estando, na coluna estratigráfica, sobreposta à Formação Puga e sotoposta à Formação Bocaina. A predominância dos calcários e dolomitos na porção oriental da Serra da Bodoquena, especificamente nas proximidades de Bonito, destacam o desenvolvimento das feições cársticas.
O Projeto RADAMBRASIL confirmou as discussões quanto aos componentes da Formação Bocaina, sendo constituídos por uma seqüência de calcários dolomíticos e dolomitos. ALMEIDA (1945, apud RADAMBRASIL, 1982), defendeu para a Formação Bocaina, uma origem marinha, sendo o ambiente de deposição caracterizado por clima quente, mares epicontinentais rasos e áreas imersas não muito afastadas da costa, onde era pequena a deposição de material clástico. A Formação Bocaina, posicionada no Pré-Cambriano Superior, ocupa uma faixa contínua em toda a porção centro-ocidental da Serra da Bodoquena e uma outra na porção centro-norte e acha-se parcialmente encoberta pela Formação Xaraiés e Pantanal, esta última, fora da área de estudo.
De acordo com informações do Projeto RADAMBRASIL, a litologia da Formação Xaraiés recobre o Grupo Cuiabá e as Formações Cerradinho e Bocaina do Grupo Corumbá, de forma discordante. A Formação Xaraiés é representada, na área pesquisada, por tufas calcárias e travertinos, depositados ao longo dos vales de drenagem. Considerada de idade pleistocênica, é oriunda, segundo ALMEIDA (1945, apud RADAMBRASIL, 1982), de material fóssil constituído de plantas e gasterópodos. A fonte do material dos depósitos dessa unidade reside nas rochas carbonatadas dos Grupos Cuiabá e Corumbá, aparecendo localmente com aspecto esponjoso e pulverulento. Exemplos dessa unidade, ocorrem na quadrícula pesquisada, em trechos do vale do rio Perdido e do rio Formoso.
Ocorre no canto inferior direito da quadrícula em estudo uma pequena porção de arenitos da Formação Aquidauana em contato com a Formação Cuiabá, datado, segundo o Projeto RADAMBRASIL, do Permiano. Constitui-se basicamente de arenitos avermelhados de granulação fina.
Malgrado a complexidade dos componentes litológicos regionais, as rochas carbonatadas é que determinam a configuração geral da paisagem da região de Bonito, dando a ela características peculiares.
4.1.2. As condicionantes climáticas
A carência de que sofre o interior do Brasil, no que diz respeito às coletas de informações climáticas, acaba por dificultar a determinação das características dos processos atmosféricos de áreas localizadas. É o caso da região de Bonito, onde não se possui nenhum posto meteorológico de coletas sistemáticas. Apenas às taxas de precipitações anuais, conseguiu-se ter acesso, podendo-se ter uma idéia apenas parcial das condições climáticas.
ZAVATINI (1992) reafirma a localização do Estado de Mato Grosso do Sul estando na confluência dos principais sistemas atmosféricos da América do Sul, sujeitando-se a mais de um tipo de regime pluviométrico. O autor destaca a presença na porção mais setentrional, do regime pluviométrico do tipo "Brasil Central" e regime do tipo "Brasil Meridional" na porção sul, divididas pela faixa climática transicional (faixa zonal).
Segundo o Macrozoneamento Geoambiental do Estado de Mato Grosso do Sul, realizado pela SEPLAN/FIPLAN-MS, a região é caracterizada pelo clima Termoxeroquimênico atenuado, "Tropical Atenuado do Centro-Sul de Mato Grosso do Sul". A temperatura média do mês mais frio é superior a 15ºC e menor que 20ºC. O período seco é de 3 a 4 meses, com precipitações anuais entre 1200 e 1500 mm. NIMER & BRANDÃO (1989), afirmam que na região, normalmente, nenhum mês é caracterizado pela ausência total de chuvas, mesmo no inverno. Além disso, como pode ser observado nos gráficos de precipitação anual, apresentados a seguir, em muitos anos o inverno é caracterizado por quantidades de chuvas abundantes que fogem da normalidade.
SANTANA NETO (1989) efetuando estudos do clima regional da porção sudeste do Pantanal, destaca a atuação da Massa Equatorial Continental, no período de outubro a março, trazendo chuvas abundantes, muitas delas de convecção. No inverno, ocorre, segundo o autor, a presença da Massa Tropical Atlântica, esta quente, e da Massa Polar Atlântica, que traz quedas de temperaturas.
ZAVATINI (1992), utilizando fatores pluviométricos e morfométricos, classificou as diferentes feições climáticas individualizadas do Estado de Mato Grosso do Sul, destacando as massas de ar atuantes em cada uma delas durante as estações do ano. A região em estudo corresponde à célula chamada pelo autor de Planalto da Bodoquena, situada imediatamente ao sul da faixa zonal divisora, implicando numa presença maior do regime pluviométrico do tipo "Brasil Meridional". Nesta porção a presença das massas de ar polar (Polar Atlântica - 20% e Polar Atlântica Velha - 25 a 15%) costumam, segundo o autor, a serem superiores aos da onda leste (Tropical Atlântica e Tropical Atlântica Continentalizada - 20 a 15 %). Destaca-se ainda a importante atuação da onda do interior (Tropical Continental - 20 a 30%), o que faz o autor considerar a existência de contrastes térmicos acentuados entre o verão e o inverno.
Os gráficos a seguir correspondem às taxas de precipitação coletadas no período de 1982 a 1996 na região de Bonito, pela Cooperativa Agropecuária e Industrial Ltda. (COOAGRI), o que dá uma idéia do comportamento climático regional. Cada gráfico representa a distribuição das chuvas ao longo do ano. O último gráfico apresentado neste grupo, corresponde à quantidade anual de precipitação durante o período.
Gráfico 4.1. - Precipitação na região de Bonito (1982-1996)
Analisando-se os gráfico anuais, pode ser observado uma certa irregularidade na distribuição das chuvas ao longo do ano e de um ano para o outro, não sendo possível estabelecer um padrão de regime hídrico regional. Contudo, percebe-se que os meses que mais sofrem de deficiência hídrica, correspondem ao período que vai de junho a setembro: o inverno, quando há um recuo na atuação das massas úmidas.
Por outro lado, este pequeno período de stress hídrico, não acarreta grandes distúrbios na umidade, especialmente do solo e, por conseqüência na configuração da paisagem, uma vez que a presença da litologia carbonática favorece a reserva subterrânea de água, ou seja, ocorre uma compensação, promovida pelas próprias condições geoecológicas.
A Serra da Bodoquena funciona como um divisor de águas entre a Bacia do Paraguai e outras bacias menores, tributárias dela. As nascentes do rios mais importantes que cortam a área estudada, estão na Serra da Bodoquena (vide Fig. 4.3.). Como rios principais temos o Rio Perdido - afluente do Rio Apa - que corre em meio ao maciço da Bodoquena de norte para o sul na porção ocidental da área; o Rio Formoso e importantes afluentes, drenando toda a porção central e norte, com nascentes na Serra da Bodoquena, correndo no sentido oeste-leste até desaguar no Rio Miranda; o Rio Mimoso, também afluente do Rio Formoso, drena, dentro da quadrícula de pesquisa, apenas litologias do Grupo Cuiabá, na porção nordeste desta.
Em virtude da maior parte da rede hidrográfica da quadrícula em estudo estar sobre relevo cárstico, a drenagem subterrânea, aliada a um outro fator ainda mais expressivo, que é a fácil infiltração, não permite que a região desenvolva uma rede hidrográfica muito densa, bem como vales aprofundados.
Comparando-se o mapa de drenagem (Fig. 4.3.) com o mapa geológico (Fig. 4.2.) e até mesmo o mapa geomorfológico (Fig. 4.1.) este último, destacando a ocorrência da litologia calcária , constata-se que onde há a presença de litologias essencialmente calcárias (Formações do Grupo Corumbá) tem-se uma densidade de canais de drenagem muito inferior àquela das áreas de tipos litológicos diversos (Grupo Cuiabá e Formação Aquidauana), podendo ser dividida, no mínimo, em duas porções bem nítidas: aquela sobre o Grupo Cuiabá e Formação Aquidauana, com um padrão de drenagem do tipo dendrítica bastante ramificada e, uma outra, com característica próximas ao padrão dendrítico, porém com uma ramificação de canais muito inferior à primeira, drenando sobre as litologias calcárias do Grupo Corumbá.
Estas peculiaridades comprovam uma predominância na penetração e no escoamento sub-superficial das águas em regiões com a presença de fenômeno cárstico. Relembra-se que, num carste em fase de desenvolvimento bem avançado, a drenagem passa a ser totalmente subterrânea. No caso de Bonito este ainda encontra-se numa fase de juventude, possuindo áreas de desenvolvimento mais avançado e áreas sem a presença de modelado cárstico na superfície. Apenas alguns canais de regime superficial, em determinados trechos, passam a correr em subsuperfície, especificamente nos períodos de deficiência hídrica.
Desse modo, em regiões cársticas, apenas observações externas não são suficientes para inferir as condições hidrológicas regionais, já que uma deficiência hídrica superficial pode ser resultante de uma superioridade do escoamento interior. Este fenômeno corresponde ao que chamamos de compensação ecológica, funcionando como um instrumento importante para a sobrevivência do meio biótico natural ou para a própria prática da agricultura.
4.2. A exploração biológica da região de Bonito
4.2.1. A estrutura edafogenética
Além dos vegetais e animais, BERTRAND (1972) inseriu o solo dentro da exploração biológica do espaço, considerando este como elemento composto por estrutura biótica, admitindo a presença de microorganismos na sua composição. Entende-se que o solo funciona como um elo de ligação entre a estrutura abiótica e a estrutura biótica, constituindo uma interface entre ambos.
Dentro da edafologia, segundo descreveu PASSOS (1996), tem sido apresentada três abordagens definidoras de seu objeto de estudo: aquela que considera o solo como sendo a litosfera e, portanto, sua origem é o elemento definidor; outra que sustenta que o solo se define por ter vida própria e deve ser considerado como biosfera; e, finalmente, aquela que considera o solo como intersecção entre a litosfera e a biosfera.
Considerando-se as limitações técnicas de se fazer um mapeamento das classes de solos da quadrícula pesquisada, via tratamento digital da imagem de satélite LANDSAT TM e, tendo em vista os objetivos deste trabalho, optou-se por utilizar a classificação desenvolvida pelo Projeto RADAMBRASIL.
De acordo com os trabalhos feitos por tal projeto, dentro do recorte espacial destinado a estudo, pode-se encontrar as classes de solos descritas a seguir (vide Fig. 4.4.). Juntamente com as classes de solo, optou-se por destacar a formação vegetal original, com o intuito de enfatizar a relação solo-vegetação.
· TSLe - Terra Roxa Estruturada Similar eutrófica latossólica - São solos com seqüência de horizontes do tipo A, B e C, apresentando horizonte A moderado ou tchernozêmico, B textural com subjacência de um horizonte B latossólico (vide Foto 4.1.). São solos férteis, porém o afloramento do material originário acaba por limitar a utilização em escala empresarial destes solos. Originários do calcário das Formações Cerradinho e Bocaina, estes solos ocupam grande porção na quadrícula pesquisada, ocorrendo especificamente no Planalto da Bodoquena. Originalmente, a vegetação que recobria esta classe de solos era de floresta.
Foto 4.1. Aspecto do solo do tipo TSLe (DIAS, 1998).
· RZ - Rendzina - são solos rasos, pouco desenvolvidos, com horizonte A tchernozêmico e muito permeáveis, com seqüência de horizontes do tipo A e R ou A, C e R, tendo no horizonte A ou C a presença de carbonatos (vide Foto 4.2.). Apresentam argila de atividade alta, textura média ou argilosa. Dominantemente, ocupam o corpo principal da Serra da Bodoquena, nas cotas mais elevadas. São resultantes da decomposição de calcários da Formação Bocaina e, raramente da Formação Cerradinho. Os afloramentos rochosos e a presença de cascalhos e calhaus impedem uma utilização intensiva destes solos, embora tenha alta fertilidade. Na quadrícula pesquisada, estes solos ocupam toda a porção central, de norte a sul, correspondendo às partes elevadas da Serra da Bodoquena, onde a presença da cobertura florestal ainda conserva-se. A alta fertilidade desta classe de solo permitiu o desenvolvimento de floresta como vegetação primária.
Foto 4.2. Aspecto do solo do tipo RZ (DIAS, 1998).
· BV - Brunizém Avermelhado - são solos minerais, não hidromórficos, caracterizados por apresentarem saturação de bases alta, argila de atividade alta e horizonte B textural imediatamente abaixo de horizonte A tchernozêmico (vide Foto 4.3.). Possuem coloração avermelhada, com seqüência bem nítida entre os horizontes A, B e C. Apresentam textura argilosa, bem drenados, moderadamente ácidos e alcalinos e com fertilidade natural elevada. São desenvolvidos a partir das litologias das Formações Cerradinho e Bocaina, do Grupo Corumbá e Cuiabá, associados às Rendzinas. Possuem excelentes potencialidades agrícolas. Ocorrem na quadrícula em dois pequenos trechos, ao longo do rio Formoso e de um de seus afluentes. Esta classe de solo tem como vegetação primária o desenvolvimento de floresta.
Foto 4.3. Aspecto do solo do tipo BV (DIAS, 1998).
· HGHVe - Glei Húmico eutrófico vértico - é definido por apresentar elevado teor de matéria orgânica e grande expansibilidade de suas argilas (vide Foto 4.4.). São originários de depósitos provenientes do calcário da Formação Cerradinho e, especialmente, sedimentos da Formação Xaraiés, do Quaternário. Ocorre na quadrícula estudada, em áreas bastante úmidas sofrendo alagamentos periódicos , ao longo dos canais dos rios Formoso e Perdido e nas proximidades do rio da Prata (fora da área, ao sul). Apesar da alta fertilidade destes solos, os periódicos alagamentos impedem a implantação de culturas perenes sem que se faça uma boa drenagem. Para culturas de ciclo curto, ou culturas adaptadas a tais condições de umidade, como o arroz de várzea, estes solos são bastante favoráveis. A vegetação primária desta classe de solo é a savana.
Foto 4.4. Aspecto do solo do tipo HGHVe (DIAS, 1998).
· LEa - Latossolo Vermelho-Escuro álico - são solos minerais, não hidromórficos, identificados pela presença de horizonte B latossólico (vide Foto 4.5.). São muito profundos, porosos e permeáveis, de textura argilosa, fortemente drenados e em avançado estágio de intemperização e intensivo processo de lixiviação. As transições entre os horizontes A, B, e C são difusas, com pouca diferenciação. São solos bastante favoráveis à mecanização pelas suas excelentes propriedades físicas e topografia, porém com baixa fertilidade natural e elevado teor de alumínio, necessitando de adubação e calagem para suplantar tais deficiências. Na região em estudo o LEa é resultante da decomposição de arenito das Formação Aquidauana e em material retrabalhado sobre as rochas do Grupo Cuiabá. Ocupam uma pequena porção no extremo oeste da quadrícula. Originalmente esta classe de solo foi recoberta por savana.
Foto 4.5. Aspecto do solo do tipo LEa (DIAS,1998).
· REa - Regossolo álico - designa-se como solos pouco desenvolvidos, com seqüências de horizontes do tipo A e C (vide Foto 4.6.). São originários a partir de litologias do Grupo Cuiabá e do complexo Rio Apa, e suas características estão relacionadas intimamente ao material originário. Apresentam limitações à mecanização, alta suscetibilidade à erosão, presença excessiva de cascalhos e em sua maioria com textura arenosa, acarretando baixa retenção de umidade e maior período com deficiência hídrica. Ocorrem na quadrícula, em uma pequena porção no extremo nordeste. Originalmente, a floresta recobria esta classe de solo.
Foto 4.6. Aspecto do solo do tipo REa (DIAS, 1998).
Dentro dos estudos fitogeográficos, considera-se o clima como o principal elemento responsável pela determinação das grandes associações vegetais do globo ou biomas, e que o solo imprime as variações locais de cada associação. Partindo desse pressuposto, a variedade lito-pedológica da quadrícula pesquisada deve apresentar uma estrutura florística variada.
Grosso modo, pode-se caracterizar a vegetação da região de Bonito, como cerrado. Assim o fazem a maioria dos mapas de escalas reduzidas (acima de 1:1.000.000), incluindo-a dentro do grupo das savanas. Todavia, uma percepção mais aproximada, nos revela que a região de Bonito apresenta uma variedade florística bastante grande, estando diretamente relacionada à diversidade da litologia existente.
O Projeto RADAMBRASIL, classificou a estrutura fitogeográfica da quadrícula pesquisada, em 3 grupos de cobertura vegetal, seja com porções fitoecológicas ainda originais ou extensões totalmente desfiguradas pela ocupação antrópica. Podemos identificar como cobertura original a Floresta Submontana (Floresta Estacional Decidual) e Savana Arbórea Densa (Áreas de Tensão Ecológica) e áreas antropizadas ocupadas com agropecuária.
Comparando-se o mapa gerado pelo Projeto RADAMBRASIL (1982) com as imagens de satélite trabalhadas (1987 e 1995), constata-se uma redução ainda maior na cobertura vegetal regional. Neste curto período de tempo, acontece na região de Bonito uma reorganização de seu espaço, comandado pelo avanço da fronteira agrícola, aliado à descoberta da região para o turismo.
A Floresta Submontana subdivisão da Floresta Estacional Decidual aparece, no recorte espacial pesquisado, sobre da Serra da Bodoquena, especialmente na unidade geológica da Formação Bocaina, nos solos rendzinas. Ocorre numa porção contínua, de norte a sul da quadrícula, facilmente visualizada nas imagens LANDSAT TM (vide Fig. 5.3, p. 148). Sua ocorrência estende-se também aos "mogotes" calcários, sendo condição para sua proteção contra os processos erosivos. Neste caso, aparece como pontos descontínuos, em meio a áreas totalmente antropizadas, ao longo da quadrícula. De acordo com o Projeto RADAMBRASIL, a Floresta Submontana desenvolve-se entre as isoipsas de 450 a 500 m e dentro da amplitude térmica de 17º a 25ºC. Caracteriza-se por apresentar perda de mais de 60% da folhagem durante a estação seca.
As principais espécies que compõem o dossel superior dessa vegetação são: angicos (Anadenanthera sp.), barriguda (Ceiba glaziovii), pau-marfim (Balfourodendron riedelianum), canafístula (Peltophorum dubium), jatobá-da-mata (Hymenaea stilbocarpa), jequitibás (Cariniana spp.) e peroba-rosa (Aspidosperma polyneuron). A submata caracteriza-se pela freqüente ocorrência de gêneros Commeluia e algumas cactáceas.
Algumas áreas designadas pelo Projeto RADAMBRASIL de Áreas de Tensão Ecológica ou de contato entre domínios fitoecológicos, especificamente entre Savana/Floresta Estacional, foram onde ocorrem interpenetrações dos dois tipos fitoecológicos, ora com predomínio de espécies florestais, ora com espécies da savana. A mesclagem de espécies deve-se à presença de tapirucu (Callisthene fasciculatas), canafístula (Peltophorum dubiun), açoita-cavalo (Luehea sp.) e outras. As espécies dos gêneros Chisquea e Guadua das gramíneas, vulgarmente denominadas taquaruçú e a Palmae acuri (Scheelea phalerata), também são ocorrentes. O Projeto RADAMBRASIL classificou a área de ocorrência de contatos fitoecológicos na quadrícula em estudo de Savana Arbórea Densa. Esta porção aparece numa pequena área no extremo NE da quadrícula estudada.
Não obstante, as imagens de satélite LANDSAT TM e os trabalhos de campo, revelaram que a maior parte desta cobertura original foi desfigurada, dando lugar, especificamente, às pastagens, restando porções isoladas em alguns morros ou ao longo de mananciais. Dentro do grupo das savanas, é importante ressaltar a existência de uma gradação entre Savana Parque a Savana Arbórea Densa, decorrente, evidentemente, de uma idêntica gradação da fertilidade dos solos.
O restante da área foi classificado pelo Projeto RADAMBRASIL como áreas dominadas pela ação antrópica, destinadas à agropecuária. Compreende a maior porção da quadrícula, correspondendo a áreas antes ocupadas, especialmente, por savanas.
4.2.2.1. As pirâmides de vegetação
Além de mostrar a espacialização horizontal da paisagem, pretende-se mostrar, também, a sua estrutura vertical. Para isto, recorreu-se à técnica das pirâmides de vegetação desenvolvida inicialmente por BERTRAND (1966). Esta técnica corresponde a uma matematização da composição florística, de importância fundamental na revelação da evolução da vegetação, bem como sua condição biogeográfica, expressada graficamente. Este trabalho é feito mediante coletas de amostras vegetais realizadas in loco nos trabalhos de campo.
As pirâmides de vegetação constituem numa técnica de cartografar a estrutura vertical da vegetação, isto é, como a vegetação apresenta-se nos diversos estratos, tendo como parâmetros principais sua abundância/dominância e sociabilidade. Além de quantificar, as pirâmides de vegetação apresentam também a dinâmica da porção vegetal cartografada, quando identifica o seu sentido evolutivo: regressão, progressão ou equilíbrio.
Embora as pirâmides dêem uma visão generalizada e grosseira da estruturação da vegetação, estas são importantes para o conhecimento do estádio da vegetação, por estratos, o que fornece preciosas indicações de sua dinâmica. Além disso, a comparação de uma formação com outra, em estrutura e dinâmica, é grandemente facilitada pela visualização da pirâmide.
"Apesar de sua concepção rudimentar, ela permite melhor definir o complexo geográfico no qual se insere a formação vegetal e de desencadear sobre explicações sinecológicas no sentido mais amplo deste termo" (BERTRAND, 1966).
Juntamente com as informações fornecidas pelas imagens de satélites utilizadas neste trabalho, referentes à cobertura vegetal, evidenciadas a partir das composições coloridas, o levantamento fitossociológico e as pirâmides construídas a partir dos mesmos, se prestam - no mínimo - para a complementação das informações absorvidas.
A seguir estão apresentadas as pirâmides de vegetação de quatro lotes de coleta da região de estudo, com as respectivas Fichas Biogeográficas de campo.
FICHA BIOGEOGRÁFICA Nº. 01 Lote nº. 01 - Formação: FLORESTA ESTACIONAL SEMIDECIDUAL (FLORESTA SUBMONTANA) Local: Bonito-MS - Fazenda Jaraguá; lado direito da estrada que dá acesso às grutas Nossa Senhora Aparecida e Lago Azul; aproximadamente 10 km da cidade de Bonito; morro residual (próximo ao topo). Domínio: Tropical Série: Floresta Climácica Submontana Data: 23/03/96 |
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ESPÉCIES POR ESTRATOS |
Nº. DE INDIVÍDUOS |
ALTURA APROX. (m) |
ESPÉCIES A/D S |
ESTRATO A/D |
|
ARBÓREO Aroeira (Astronium urundeuva) Gonçalo (Astronium fraxinifolium) Ipê-roxo (Tabebuia spp.) Jacarandá (Dalbergia sp.) Carobinha (Jacaranda copoia) Capitão (Terminalia argentea) Angico (Piptadenia spp) Ipê-branco (Tabebuia impetiginosa) Guatambú (Combretum sp.) |
. 12 1 3 1 1 1 2 2 3 |
. 25 27 27 18 17 17 15 30 12 |
. 3 + 1 + + + 1 1 1 |
. 1 1 1 1 1 1 1 1 1 |
. . . . 4 = |
ARBORESCENTE Marmelo (Erythroxylum sp) Catiguá-branco Bacurí |
. 2 4 2 |
. 8 7 5 |
. 1 1 + |
. 1 1 1 |
. . 2 = |
ARBUSTIVO Catiguá-branco Guatambú (Combretum sp.) Tarumãzinho (Vitex sp.) Sangra-dágua Peroba-branca (Hymnenea stillocarpa) |
. 10 7 10 1 1 |
. 2,5 1,7 2 2 2 |
. 2 2 2 + + |
. 2 2 2 2 2 |
. . 3 <= => |
SUBARBUSTIVO Marmelo (Erythroxylum sp) Peroba-branca (Hymnenea stillocarpa) Imbiruçu |
. 5 2 1 |
. 0,7 1 0,7 |
. 2 1 + |
. 1 1 1 |
. 1 = |
HERBÁCEO/RASTEIRO Amoreira (Clorophora trinctoria) Unha-de-vaca (Bauhinia sp.) Angico (Piptadenia spp Taleira Grama |
. 3 25 3 10 |
. 0,3 0,3 0,15 0,2 0,1 |
. 1 3 1 3 4 |
. 3 3 3 3 3 |
. . 1 <= => |
HÚMUS/SERRAPILHEIRA: ocorrência de 1 cm de folhas seca e galhos em avançado estado de decomposição. | |||||
ALTITUDE: 460 m INCLINAÇÃO: 50º/60º (próximo ao topo). EXPOSIÇÃO: leste-nordeste. CLIMA: tropical sub-úmido. Precipitação anual: 1200 a 1500 mm, com caráter estacional (seca no inverno e chuva no verão). Tempertura média anual: por volta de 22ºC. MICROCLIMA: umidade média; penetração de raios solares até o nível da superfície, o que favorece o aparecimento de espécies hebáceo-rasteiras. ROCHA-MATRIZ: calcário dolomítico. EROSÃO SUPERFICIAL: localizada em alguns pontos, porém insignificante. AÇÃO ANTRÓPICA: atualmente, nenhuma ação antrópica é registrada. DINÂMICA DE CONJUNTO: o conjunto apresenta neste momento uma certa estabilidade, contudo a presença de exemplares vegetais jovens, indica potencial para uma evolução progressiva. |
FICHA BIOGEOGRÁFICA Nº. 02 Lote nº. 02 - Formação: FLORESTA ESTACIONAL SEMIDECIDUAL (FLORESTA SUBMONTANA) Local: Bonito-MS - Fazenda Jaraguá; lado direito da estrada que dá acesso às grutas Nossa Senhora Aparecida e Lago Azul; aproximadamente 10 km da cidade de Bonito; morro residual (próximo à base). Domínio: Tropical Série: Floresta Climácica Submontana Data: 23/03/96 |
|||||
ESPÉCIES POR ESTRATOS |
Nº. DE INDIVÍDUOS |
ALTURA APROX. (m) |
ESPÉCIES A/D S |
ESTRATO A/D |
|
ARBÓREO Cumbarú (Dipteryx odorata) Ipê-roxo (Tabebuia spp.) Pau-marfim(Baufourodendron riendelianun) Vinhático (Platymenia sp.) Timbó (Magonia pubescens) Angico-vermelho (Piptadenia spp) Castelo (Alsis sp) Gonçalo (Astronium fraxinifolium Esponja-de-macaco Capitão (Terminalia argentea) Carobinha (Jacaranda capoia) |
. 1 1 1 1 4 3 5 2 1 1 1 |
. 13 13 13 13 13 11 17 17 12 19 8 |
. + + + + 2 2 2 1 + + + |
. 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 |
. . . . . 4 = |
ARBORESCENTE Mamica-de-porca (Fagara kleinii) Osso-de-burro Catiguá-branco |
. 1 1 3 |
. 5 5 5 |
. + + 1 |
. 1 1 1 |
. 1 = |
ARBUSTIVO Cruzeirinho Imbiruçú/Palmeira-do-mato Dedaleira Laranjeira-brava (Sloanea sp.) Unha-de-vaca (Bauhinia sp) Guatambú (Combretum sp.) Marmelo (Erythroxylum sp) |
. 1 1 1 1 5 3 3 |
. 1,5 1,5 2 2 2 1,5 1,5 |
. + + + 1 2 1 1 |
. 1 1 1 1 1 1 1 |
. . . .1 <= => |
SUBARBUSTIVO Cânfora-do-mato Gravatá Angico (Anadenanthera sp.) Unha-de-vaca (Bauhinia sp.) |
. 10 3 2 4 |
. 0,8 0,5 0,5 0,5 |
. 2 1 1 2 |
. 2 2 2 2 |
. 2 <= => |
HERBÁCEO/RASTEIRO Unha-de-vaca (Bauhinia sp) Tarumãzinho (Vitex sp) Maria-Preta (Diatenapteriza sorbifolia) Samambaia Grama outras |
. 20 1 1 3 |
. 0,3 0,3 0,3 0,2 0,1 |
. 3 + + 1 4 2 |
. 1 1 1 1 1 |
. . 1 = |
HÚMUS/SERRAPILHEIRA: apresenta 8 a 10 cm de solo escuro influenciado pela decomposição da matéria orgânica, mesclado com cascalho (solo pedregoso). A serrapilheira propriamente dita, chega a 1 cm de espessura, com manchas sem ocorrência. As folhas se apresentam secas, em processo de decomposição. Fica mais ou menos evidente, uma semi-caducifolia. Afloramentos localizados de rocha matriz são observados também. | |||||
ALTITUDE: 420 m INCLINAÇÃO: 40º/45º (próximo à base do morro). EXPOSIÇÃO: leste-nordeste. CLIMA: tropical sub-úmido. Precipitação anual: 1200 a 1500 mm, com caráter estacional (seca no inverno e chuva no verão). Tempertura média anual: por volta de 22ºC. MICROCLIMA: umidade média; penetração de raios solares até o nível da superfície, o que favorece o aparecimento de espécies hebáceo-rasteiras. ROCHA-MATRIZ: calcário dolomítico. EROSÃO SUPERFICIAL: desprezível. AÇÃO ANTRÓPICA: atualmente, a área não apresenta vestígios de intervenção antrópica. DINÂMICA DE CONJUNTO: observa-se exemplares vegetais secos e eretos. Todavia, não interfere na dinâmica do conjunto. A área está basicamente em equilíbrio. |
FICHA BIOGEOGRÁFICA Nº. 03 Lote nº. 03 - Formação: CERRADO (ÁREAS DE TENSÃO ECOLÓGICA) Local: Bonito-MS - Fazenda Anhumas; lado esquerdo da estrada BonitoSanta Cruz; aproximadamente 8 km da cidade de Bonito. Domínio: Tropical - Série: Cerrado Aberto - Data: 23/03/96 |
||||||
ESPÉCIES POR ESTRATOS |
Nº. DE INDIVÍDUOS |
ALTURA APROX. (m) |
ESPÉCIES A/D S |
ESTRATO A/D |
||
ARBÓREO Aroeira (Astronium urundeuva) Açoita-cavalo (Luehea divaricata) |
. 4 3 |
. 11 10 |
. 1 1 |
. 1 1 |
. 1 = |
|
ARBORESCENTE Para-tudo (Tabebuia caraiba) Capitão (Terminalia argentea) Guatambú (Combretum sp.)) Aroeira (Astronium urundeuva Tarumãzinho (Vitex sp) Açoita-cavalo (Luehea divaricata) Dedaleira |
. 2 12 2 5 3 5 3 |
. 7 7 7 6 4 4 5 |
. 1 2 1 2 1 2 1 |
. 2 2 2 2 2 2 2 |
. . . 1 = |
|
ARBUSTIVO Aroeira (Astronium urundeuva Tarumãzinho (Vitex sp) Cruzeirinho |
. 30 20 20 |
. 1,5 1,5 1,5 |
. 3 3 3 |
. 3 3 3 |
. 4 <= => |
|
SUBARBUSTIVO Gravatá Sapé Guatambú (Aspidosperma sp) Angico (Piptadenia sp) |
. 7 10 2 |
. 0,5 0,5 0,5 0,5 |
. 2 2 2 1 |
. 2 2 2 2 |
. . 3 = |
|
HERBÁCEO/RASTEIRO Bacuri Aroeira (Astronium urundeuva) Unha-de-vaca (Bauhinia sp.) Capim-limão Pitanguinha Dormideira Amendoim-do-campo(Peltogyne sp.) outras |
. 30 15 |
. 0,3 0,3 0,3 0,4 0,3 0,15 0,15 |
. 1 3 3 4 2 4 4 2 |
. 3 3 3 3 3 3 3 3 |
. . . . 4 <= => |
|
HÚMUS/SERRAPILHEIRA: Serrapilheira reduzida, praticamente ausente. Tudo indica que as queimadas anuais acabam favorecendo os estratos arbustivos e subarbustivos. O embasamento é de filitos. Solos de horizonte A escuro até 30 cm de profundidade. | ||||||
ALTITUDE: 440 m INCLINAÇÃO: superfície horizontal. EXPOSIÇÃO: vertical. CLIMA: tropical sub-úmido. Precipitação anual: 1200 a 1500 mm, com caráter estacional (seca no inverno e chuva no verão). Tempertura média anual: por volta de 22ºC. MICROCLIMA: baixa umidade/insolação intensa. ROCHA-MATRIZ: filito/calcário dolomítico. EROSÃO SUPERFICIAL: inexistente. AÇÃO ANTRÓPICA: área utilizada para pastagem. DINÂMICA DE CONJUNTO: a área está cercada e utilizada para a criação (pastagem). Observa-se a implantação de pastagem artificial, submetida a queimadas anuais, sem a retirada das espécies vegetais originais. No conjunto, apesar da interferência, a área apresenta uma dinâmica altamente positiva, evidenciada pelo grande número de espécies do tipo arbóreas nos estratos inferiores., revelando a capacidade elevada de espécies do cerrado de recolonizar áreas de terras revolvidas. |
FICHA BIOGEOGRÁFICA Nº. 04 Lote nº. 04 - Formação: CERRADO (ÁREAS DE TENSÃO ECOLÓGICA) Local: Bonito-MS - Fazenda Potreiro; lado direito da estrada BonitoGuia Lopes da Laguna; próximo ao Córrego São João; aproximadamente 15 km da cidade de Bonito. Domínio: Tropical Série: Cerrado Aberto Data: 23/03/96 |
|||||
ESPÉCIES POR ESTRATOS |
Nº. DE INDIVÍDUOS |
ALTURA APROX. (m) |
ESPÉCIES A/D S |
ESTRATO A/D |
|
ARBÓREO Quebracho Aroeira (Astronium urundeuva Bocaiúva Louro-branco (Ocotea sp.) Pororoca (Rapanea sp.) Açoita-cavalo (Luehea divaricata) Barba-timão-de-folha-miúda Sucupira (Bowdichia sp.) Figueira (Ficus sp.) |
. 2 5 3 2 3 1 1 1 1 |
. 13 13 10 13 10 10 10 10 10 |
. + 1 1 + 1 + + + + |
. 1 1 1 1 1 1 1 1 1 |
. . . . .1 = |
ARBORESCENTE |
|||||
ARBUSTIVO |
|||||
SUBARBUSTIVO Guavira Angiquinho (Anadenanthera sp.) Araçá-do-campo (Eugenia sp.) Gravatá |
. 120 30 15 15 |
. 1 0,7 0,7 0,7 |
. 5 3 3 3 |
. 5 5 5 5 |
. . 4 <= => |
HERBÁCEO/RASTEIRO Dormideira Pinheirinho-do-campo Bromélia/cactácea Caju-rasteiro Manguinha-do-campo Gramínea outras |
. 7 1 1 |
. 0,1 0,2 0,05 0,4 0,4 0,1 |
. 2 1 1 + + 3 2 |
. 2 2 2 2 2 2 2 |
. . . .2 = |
HÚMUS/SERRAPILHEIRA: ocorrência de folhas secas sem sinal de decomposição, localizadas próximo às moitas de Guavira. Húmus inexistente. | |||||
ALTITUDE: 280 m INCLINAÇÃO: 15º (próximo ao vale do córrego São João). EXPOSIÇÃO: nordeste. CLIMA: tropical sub-úmido. Precipitação anual: 1200 a 1500 mm, com caráter estacional (seca no inverno e chuva no verão). Tempertura média anual: por volta de 22ºC. MICROCLIMA: pouca umidade, devido à forte insolação. Nas moitas de Guavira, há a retenção de folhas secas, revestindo a superfície do solo, propiciando uma umidade maior, o que vai refletir na presença de gramíneas. ROCHA-MATRIZ: filito com superfície revestida, predominantemente, por seixos quartzosos. EROSÃO SUPERFICIAL: desprezível. AÇÃO ANTRÓPICA: trata-se de uma propriedade utilizada ara pastagens, o que pode levar à suposição de uma ação antrópica, cuja pressão maior se deu, provavelmente há 15/20 anos atrás. Do contrário, pode ser que a Guavira, que se apresenta sem forma de "carrascal", recobrindo um solo essencialmente pedregoso, represente ainda as condições naturais. DINÂMICA DE CONJUNTO: apesar da áreas estar sobre um solo pedregoso e sob um possível ação antrópica, a dinâmica do conjunto apresenta-se em equilíbrio, tendo o estrato herbáceo/rasteiro como dominante. |
Como relacionado anteriormente, a região de estudo apresenta, ainda hoje, basicamente 2 grupos de cobertura vegetal originais: a Floresta Submontana (Floresta Estacional Decidual) e as Áreas de Tensão Ecológica, representadas pelas Savanas (cerrado e cerradão). As quatro amostras coletadas para a construção das pirâmides procuram representar a estrutura da vegetação desses dois grupos vegetais, em situações ecológicas diferentes. Da Floresta Submontana foram coletadas informações em dois ambientes: um no sopé do morro residual (mogote) e outra amostra, em altitudes mais elevadas, próximo ao topo desse mesmo morro (vide Foto 4.7.). As amostras de Cerrado, também foram coletadas em dois ambientes diferenciados: os dois sobre uma litologia com predomínio de filitos (Grupo Cuiabá), porém em locais bastante distantes e com solos diferenciados: um com horizontes bem desenvolvidos (vide Foto 4.8.) e outro com estrutura pedregosa (vide Foto 4.9.).
Foto 4.7. Aspecto da vegetação dos Lotes 01 e 02 (DIAS, 1998).
Foto 4.8. Aspecto da vegetação do Lote 03 (DIAS,1998).
Foto 4.9. Aspecto da vegetação do Lote 04 (DIAS, 1996).
Observando-se as pirâmides das amostras descritas, pode-se verificar que, estruturalmente, as porções de coleta de amostras revelam diversidades entre si, mesmo dentro do mesmo grupo florestal.
Nas duas amostras da Floresta Submontana, embora muito próximas uma da outra, apenas com uma diferença altimétrica e de declividade, apresentam uma diferença bastante expressiva na sua estrutura e composição florística por estratos, bem como pela sua forma de agrupamento e abundância/dominância.
Considerando-se as duas amostras de cerrado conjuntamente, estas revelam, igualmente, estruturação diferenciada. Na amostra do Lote nº. 03, sobre filito/calcário, com solos de horizontes bem desenvolvidos, o cerrado apresenta vegetação nos 5 estratos analisados: arbóreo, arborescente, arbustivo, subarbustivo e herbáceo/rasteiro, podendo ser encontrado indivíduos de espécies arbóreas em todos os estratos, o que indica potencial para o desenvolvimento de uma estrutura florestal de porte arbóreo, apesar da área estar sendo utilizada atualmente para pastagem e estar sujeita a queimadas anuais. No Lote nº. 04, o cerrado está sobre um solo bastante pedregoso, marcado por filitos e seixos quartzosos. Esta amostra apresenta apenas 3 estratos: arbóreo, subarbustivo e herbáceo/rasteiro. O que chamou a atenção nesta porção, foi a ausência de espécies do tipo arbóreas nos estratos inferiores. Neste caso, os estratos mais representativos correspondem aos estratos inferiores, que dominam a estrutura florística. A atual utilização dessa área para pastagem natural, mesmo sem a presença de espécies "alienígenas", indica uma redução nas possibilidades de regeneração da formação florestal.
4.3.1. A concepção natural e humana do espaço
Uma paisagem natural define-se segundo Oliver Dollfus (apud BOLÓS y CAPDEVILA, 1992), como:
" la expresión visible de un medio que, en la medida en que nos es posible saberlo, no há experimentado la huella del hombre, por lo menos en una fecha reciente. En nuestra época, los paisajes naturales son los que no se inscriben en la oikumene en sentido estricto".
Engloba-se dentro das paisagens naturais todos aqueles espaços que não são habitados ou aproveitados pelo homem. Com efeito, tratando-se de espaços "virgens", tal conceito aparece apenas como uma abstração, já que nenhum canto do planeta resta por explorar. BOLÓS y CAPDEVILA (1992), considera então que:
"en un sentido más amplio, habrá que convenir en calificar como naturales todos aquellos espacios en los que la intervención humana, en el pasado o en el presente, no há llegado a alterar significativamente la presencia y funcionamiento de los demás elementos, abióticos y bióticos, que los integran. El problema estriba en determinar el umbral o nivel de antropización a partir del cual se considera que un espacio deja de ser natural. (...) cabría incluir dentro del apartado de espacios naturales a aquellos en los que la intervención humana há producido la sustitución del paisaje climácico original por otro cuyos elementos naturales constitutivos son distintos, pero que puede haber alcanzado un nuevo estadio climácico".
Esta abordagem parece mais elucidativa para compreendermos as paisagens atuais, e classificá-las de acordo com os níveis de antropização.
As paisagens antropizadas definem-se, justamente, pelo oposto do que se entende por paisagem natural, isto é, onde a paisagem é marcada pela presença humana e sua expressão fisionômica reflete elementos por ele produzidos. A presença ou a ausência da cobertura vegetal, constitui, desde o princípio, o principal elemento considerado para se avaliar o grau de antropização de uma paisagem, já que se confere à vegetação o valor de elemento sintético da paisagem ou o resultado fisionômico das relações sociedade-natureza.
A Geografia tem na relação sociedade-natureza o seu ponto central de análise. Objetivando desvendar as anomalias resultantes desta relação, os geógrafos têm buscado fórmulas para equilibrar este processo que é desigual, isto é, o processo exploratório do espaço pelo agente antrópico, cria um desequilíbrio e uma defasagem entre os dois processos evolutivos: o da natureza e o social. Ambos processos devem ser concebidos hoje, como processos únicos e interdependentes. O meio ambiente não se define apenas pelos elementos bióticos e abióticos, mas sim pelos processos e fenômenos decorrentes da relação social com a natureza. A própria definição de meio existe em relação ao homem e define-se em função dele.
O desenvolvimento social, ocorre em detrimento da apropriação dos elementos naturais, transformando-os em produtos sociais. Para tanto, a paisagem que é outro conceito existente graças à relação sociedade-natureza , é constituída de uma miscelânea de elementos sócio-naturais, definidos por esta relação.
Tendo em vista que, sob o sistema capitalista de produção, a natureza é vista como uma fonte de recursos, prontos a serem explorados, a riqueza real ou potencial de cada espaço, funciona como o elemento determinante da ocupação e exploração de seus recursos. Nestes termos, mediante os elementos de que dispõe um determinado espaço, este irá sofrer maior ou menor grau de intervenção, especialmente quando se trata dos elementos mais lucrativos economicamente.
4.3.2. As transformações históricas da paisagem
As paisagens constituem, como enfatizou BERTRAND (1972), uma entidade essencialmente dinâmica numa escala têmporo-espacial. Assumiu-se, neste trabalho, que a paisagem é um produto que evolui historicamente em função da exploração a que é submetida pelo elemento antrópico, isto é, a paisagem é um produto histórico da relação da sociedade com a natureza, sendo por isto um reflexo da sociedade que a produziu.
Nestes termos, para compreensão da fisiologia das paisagens, há que se considerar o aparato tecnológico e cultural e o modo de organização das sociedades, juntamente com os recursos naturais que dispõe tal espaço. PASSOS (1996) contribui com o exposto ao relatar que a paisagem é "um espaço em três dimensões: natural, social e histórica", e que, portanto, seu estudo deve ignorar a ruptura entre a Geografia Física e a Geografia Humana. E mais, sugere que é válido que se parta da sociedade para a natureza no entendimento de sua configuração.
Com efeito, considerando-se a globalidade do pensamento capitalista hoje, pode-se dizer que as paisagens submetem-se praticamente a uma uniformização no modo de se produzi-las. A forma de se encarar o espaço, ao menos nas camadas sociais mais atuantes na sua produção, é que ele constitui um potencial passível de gerar riquezas materiais. Deste modo, a diferenciação fisiológica das paisagens de um local para outro, vai ser determinada bem mais pelas potencialidades geoecológicas do que pela forma de se apreendê-lo e produzi-lo.
4.3.3. As derivações antropogênicas do espaço de Bonito
A generosidade com que a natureza tem produzido cada uma das formas abióticas ou bióticas da região de Bonito, acabou por expor suas riquezas ao processo exploratório.
O espaço natural da região de Bonito foi submetido, ao longo do tempo, em especial nos últimos 10 anos, a uma ampla remodelagem, imprimindo nele a materialidade física da ação antrópica, o que contribuiu, muito claramente, para a definição de algumas unidades paisagísticas.
O avanço da fronteira agropecuária, aliado à descoberta de Bonito pela mídia, divulgando-a para o mundo como uma expressão turística de belezas naturais, foram os principais responsáveis pelas transformações inseridas na paisagem regional. As melhorias no acesso à região contribuíram em muito para que esse processo fosse sendo gradativamente acelerado o que pode ser percebido, ao analisar-se o período compreendido pelas imagens de satélites utilizadas (1987-1995) (vide Fig. 5.2. e 5.3.).
A penetração humana na região de Bonito com o intuito de se estabelecer ali, data de meados do século XIX (1869). A fundação da cidade deu-se em 1927 e a passagem à categoria de município, ocorreu apenas em 1948. O espaço regional estava ocupado apenas em alguns pontos, com uma atividade exploração pouco expressiva, baseada praticamente na produção de subsistência e para o consumo local, sem provocar grandes transformações no espaço natural.
Quando da realização, em 1993, de trabalhos na região, efetuando o mapeamento do uso do solo na escala 1:60.000, de uma boa parte da área no entorno de Bonito, a partir dos rastreamentos aerofotogramétricos de 1965/1966 (AST-10/USAF), estes já acusavam transformações mais insidiosas, especialmente nas áreas de cerrado, decorrente da penetração da criação de gado.
As décadas de 60 e 70 foram marcadas, na história do Brasil, pela grande penetração de sulistas e paulistas na região Centro-Oeste do Brasil, responsáveis pelo avanço da fronteira agrícola. Neste processo, as novas frentes de colonização, chegaram até a região de Bonito, encontrando ali solos de primeiríssima qualidade, propícios à prática agropecuária.
Quando compara-se a compartimentação da paisagem apresentada nas fotografias aéreas (AST-10/USAF) de 1965/1966 que deram origem às cartas topográficas da Diretoria do Serviço Geográfico , com o mapeamento feito pelo Projeto RADAMBRASIL, em 1982, e com a das imagens de satélites (1987/1995) trabalhadas, verifica-se claramente, nestes três períodos, um grande avanço no processo de ocupação antrópica, anexando gradativamente novas áreas ao processo produtivo.
Ao observar as imagens de satélite dos anos 1987 e 1995 (vide Fig. 5.2. e 5.3.), constata-se que, das áreas florestais (Floresta Submontana), poucas foram as áreas devastadas para a ocupação antrópica, estando mais ligado às áreas de cerrado, já bastante degradados e ocupados há tempos para pastagens naturais. Da Floresta Submontana, que recobre o maciço da Serra da Bodoquena, as imagens de satélites de 1995, trazem realçadas um avanço de devastação florestal, na sua porção centro-ocidental.
A Tabela 4.1. apresentada a seguir mostra, no período e 1990 a 1995, o avanço das áreas cultivadas das principais lavouras temporárias no município de Bonito:
Tabela 4.1. - Bonito/MS - Área Plantada em Hectares (1990-1995)
PRODUTO | 1990 |
1991 |
1992 |
1993 |
1994 |
1995 |
soja | 7.500 |
11.540 |
12.300 |
10.012 |
11.200 |
19.550 |
milho | 8.600 |
8.260 |
6.000 |
9.768 |
14.000 |
6.200 |
trigo | 700 |
1.000 |
600 |
3.100 |
2.000 |
2.200 |
feijão | 300 |
950 |
570 |
947 |
650 |
800 |
arroz | - |
20 |
- |
70 |
313 |
100 |
TOTAL | 17.100 |
21.770 |
19.470 |
23.897 |
28.163 |
28.850 |
Fonte: IBGE - Produção Agrícola Municipal - Sistema IBGE de Recuperação Automática - SIDRA/97
Esta outra tabela (4.2.), representa a evolução da pecuária bovina no período de 1986 a 1995.
Tabela 4.2. - Bonito/MS - Pecuária Bovina em Número de Cabeças (1990-1995)
1986 |
1987 |
1988 |
1989 |
1990 |
1991 |
1992 |
1993 |
1994 |
1995 |
239.120 |
242.341 |
244.000 |
249.230 |
345.760 |
344.726 |
321.824 |
318.191 |
289.265 |
278.345 |
Fonte: IBGE - Pesquisa Pecuária Municipal - Sistema IBGE de Recuperação Automática - SIDRA 97 / Anuários Estatísticos de Mato Grosso do Sul.
Embora a Tabela 4.2. demonstre números que contradizem o exposto a respeito do avanço das áreas de pastagens, constatou-se que importante parte do gado criado dentro do espaço de Bonito, na verdade pertence ao município de Porto Murtinho, que são conduzidos até Bonito para a engorda e no momento da contabilização aparecem como pertencentes a este último.
Hoje, Bonito constitui, no interior brasileiro, um dos locais mais visitados por turistas de todos os cantos do Brasil e do exterior. Juntamente com o Pantanal, Bonito é hoje, motivo de orgulho para o turismo sul-matogrossense. A proximidade ao Pantanal, acabou vinculando os dois roteiros turísticos, tornando obrigatório àqueles turistas que se dirigem ao Pantanal, passar por Bonito e vice-versa.
A cidade de Bonito, passou nos últimos 3 anos, por um processo de investimento maciço no setor de turismo, tornando uma das principais atividades econômicas do município. Para tanto, investiu-se na infra-estrutura, como hotelaria, agências de turismo, comércio, organização do turismo, acessos aos locais de visitas etc., proporcionando mais conforto aos turistas que visitam as suas belezas naturais. Além disso, Bonito tem sido intensamente divulgado pela mídia, sendo motivo de diversas reportagens, seja na TV ou em revistas e jornais, divulgando as belezas da região. Isto tudo significou uma avalanche de pessoas a procurar a região, que passa a extrapolar sua capacidade de suporte em épocas de pico, como por exemplo no carnaval, quando a cidade recebe a visita de um número de turistas igual ou superior a sua população urbana total.
Apesar dos períodos de pico, como os feriados prolongados, de acordo com informações de empresários hoteleiros da cidade, em Bonito não dá para se distinguir alta ou baixa temporada, funcionando como uma permanente atração turística do interior do Brasil, comparado à Chapada dos Guimarães ou ao Pantanal.
Bonito dispõe, atualmente, de uma razoável rede de hotéis, podendo encontrar desde pousadas muito simples até um hotel 4 estrelas (Zagaia Resort Hotel) construído fora do centro urbano proporcionando uma contato mais direto do turista com a natureza (vide Foto 4.10.). De acordo com informações de um dos proprietários do Zagaia Resort Hotel, a instalação do mesmo, rendeu ao espaço bonitense um investimento de mais de US$ 4 milhões, de capital vindo de fora, assim como grande parte dos investimentos, tanto em hotelaria, quanto em agências de turismo que instalam na cidade em busca da reprodução de seu capital.
Foto 4.10. Vista geral do Zagaia Resort Hotel (DIAS, 1998)
O turismo de Bonito pode ser classificado como hidrorrecreativo e rural, aspecto valorizado especialmente por aqueles que procuram um contato mais direto com a natureza. As formas cársticas grutas, abismos etc. e os rios cristalinos e encachoeirados e nascentes, são os principais atrativos. Um fato bastante positivo para o turista que procura Bonito é a possibilidade de manter uma interatividade muito íntima e ímpar com a natureza, através dos mergulhos nos rios cristalinos, em meio a uma riquíssima fauna e flora aquáticas, o que destaca o turismo de Bonito como seleto apenas para um tipo de turista: aqueles amantes da natureza.
O núcleo urbano de Bonito tem funcionado apenas como local de recepção e de hospedagem dos turistas. Constitui-se de um pequeno centro comercial, oferecendo opções de produtos artesanais regionais, especialmente indígenas.
Dentre os locais mais visitados pelos turistas que procuram Bonito como local para lazer, podemos destacar, a Gruta do Lago Azul, o Aquário Natural, a Ilha do Padre, o Balneário Municipal, a descida de bote pelo Rio Formoso, as Cachoeiras do Mimoso e do Aquidabã, as cascatas do Rio do Peixe etc. A maioria destes pontos situam-se distante do centro urbano do município, necessitando de vários dias para visitar todos eles (vide Fig. 4.9.).
Em termos de arrecadação de divisas para o município, o turismo, oficialmente, ainda é a 3ª principal atividade econômica, superada pela pecuária e pela agricultura. Segundo informações de órgãos públicos, embora o turismo seja responsável, em grande parte, pelo dinamismo da economia do município, nos cofres públicos, este setor ainda tem uma participação apenas de caráter indireto, isto é, o município ganha com os investimentos em novos hotéis, pousadas, restaurantes, comércio etc., que sobrevivem de capital oriundo do turismo.
O processo de estruturação da cidade para o turismo é recente e as Secretarias ligadas à atividade, estão organizando-se lentamente, na procura de estar mais diretamente ligadas ao turista que chega à cidade, bem como criando uma consciência preservacionista entre a população local e turistas.
A atividade é responsável, também, por um processo de terciarização da população de Bonito, o que contribuiu, em grande parte, pela elevação na qualidade de vida da população em geral, que passou a ter outras opções de trabalho e formas de "ganhar a vida". Por outro lado, o turismo em Bonito ainda enfrenta resistências por parte da população local, especialmente de alguns fazendeiros, que vêem na atividade, uma invasão que coloca em risco o seu espaço vivido. O turista, é para eles, um estranho que vem usufruir de um espaço que não lhe pertence. Essa parcela da população vive à margem de uma realidade que já faz parte da história de Bonito.
Apesar de Bonito carregar o belo rótulo de cidade turística, muitos problemas infra-estruturais ainda estão por serem resolvidos. Apenas uma percentagem muito baixa (menos de 30%) da cidade é beneficiada com rede de esgoto. Além disso, o tratamento do mesmo é ineficiente. Aliado a este fato, está a questão do lixo urbano, que ainda carece de uma destinação mais racional. Estes são exemplos de deficiências que não condizem com uma cidade que se julga turística, e que, para tanto, devem ser superadas. Diálogos informais com a equipe de administração do município, demonstraram, a priori, grandes preocupações no sentido de resolver os problemas enfrentados pela cidade, no campo infra-estrutural, em particular no ambiental.
Aliado a esse fato, a grande massa de visitantes que chega à cidade, acaba por colocar em risco a integridade das belezas de Bonito, já que juntamente com o turista, uma série de outras questões negativas são desencadeadas, como por exemplo, o acréscimo na demanda por água e o aumento da produção de resíduos sólidos.
Pretende-se neste item fazer uma descrição e análise das paisagens de Bonito, considerando-se todas as observações dos trabalhos de campo, bem como o material cartográfico utilizado, estabelecendo-se um ligação entre os elementos constituintes da paisagem, responsáveis pela configuração fisionômica e pela dinâmica atual de cada unidade.
A região de Bonito está localizada numa área de contato de diferentes tipos e grupos litológicos, com intensos processos tectônicos, implicando na produção de paisagens particulares. Como descrito no item 4.1.1, está assentada basicamente sobre rochas carbonáticas calcários e dolomitos das Formações Cerradinho e Bocaina, do Grupo Corumbá no topo, e rochas do Grupo Cuiabá, na base, arcabouço geológico da Serra da Bodoquena.
A predominância de rochas carbonatadas resulta na produção de paisagens com feições cársticas. Deste modo, as paisagens de Bonito vão apresentar características que estarão diretamente relacionadas ao fenômeno cárstico.
O carste encontrado na Serra da Bodoquena, demonstra a sua relativa juventude, quando comparado com outras regiões do mundo, descritas por outros autores. Este fato é visivelmente comprovado quando analisados os padrões e densidade da rede de drenagem (vide Fig. 4.3.) que cortam o bloco calco-dolomítico da Serra da Bodoquena, ainda predominantemente superficial e, também, pela ausência de drenagem mais desenvolvidas e típicas como o padrão multibasinal. No carste de fase madura, a drenagem superficial tende a desaparecer por completo, passando a ser totalmente subterrânea. Assim, estando o carste de Bonito ainda numa fase de desenvolvimento inicial, não apresentará formas de grande expressão, ocorrendo até mesmo a ausência de algumas feições inerentes ao carste bem desenvolvido, como dolinas de grande extensão, uvalas etc.
ALMEIDA (1965), confere o retardamento no desenvolvimento da morfologia cárstica na região da Serra da Bodoquena provavelmente à natureza mais dolomítica, nos calcários e dolomitos da Formação Cerradinho. A presença de magnésio nos calcários dolomíticos estabelecem uma maior resistência à dissolução pela água. Comprovou-se, nesta pesquisa, a natureza muito mais dolomítica das rochas da região quando das viagens de campo, durante as quais verificou-se que os morros residuais (mogotes) são constituídos de calcário dolomítico, o principal motivo de sua manutenção. Constatou-se também que, além da predominância de calcários dolomíticos, outros fatores reforçam a menor solubilidade dos calcários dolomíticos da região: a ocorrência de fácies mais impuras constituídas por metagrauvacas e veios de quartzo preenchendo zonas de fraturamento, caracterizadas por estruturas de cataclases e brechação. Os afloramentos deste tipo de calcário na região apresentam-se desprovidos ou com muito poucas microformas como as lapiás, feições habituais em calcários mais solúveis, como o calcítico.
CORRÊA et alii (1979), destaca a porção oriental da Serra da Bodoquena, como a área onde as feições cársticas apresentam-se mais desenvolvidas, justamente na região onde assenta-se a cidade de Bonito, alvo da pesquisa. É aí onde encontram-se a grande maioria de cavernas ou grutas, dolinas, abismos, paredões abruptos, mogotes, formas pinaculadas etc. Este fato está diretamente relacionado a uma maior ocorrência de calcário calcítico, os quais apresentam uma maior fragilidade perante as ações de dissolução da água. Quando tectonizados, o favorecimento da infiltração em suas fraturas estabelece intensa dissolução originando as feições de dolinas e cavernas.
Em Bonito, desenvolveu-se uma formação geológica pouco típica, representada pela Formação Xaraiés. Esta, sendo constituída de depósitos calcários provenientes das rochas carbonatadas dos Grupos Corumbá e Cuiabá, aparece em três pontos isolados na região de Bonito, acompanhando as margens muito úmidas e planas dos rios Formoso e Perdido. Constitui-se de um calcário pulverulento de cor branco-amarelada ou cinza (vide Foto 4.11.), composto por imensa quantidade de materiais fósseis (conchas, carapaças etc.). A exploração econômica deste material tem desfigurado as paisagens originais, restando aspectos visuais agressivos. (vide Foto 6.4.)
Foto 4.11. Detalhe do calcário da Formação Xaraiés (DIAS, 1998).
O fenômeno cárstico de Bonito produziu extensas plataformas de vertentes retilíneas, desprovidas de vales profundos (vide Foto 4.12.), entremeadas
Foto 4.12. Vista geral das vertentes retilíneas entre os mogotes (DIAS, 1998).
pelos mogotes que erguem-se abruptamente, sem uma transição do plano para o inclinado. São paisagens decorrentes da predominância da infiltração em detrimento do escoamento superficial, o que faz com que o processo de dissolução suplante a erosão. Excetua-se o grande vale em forma de canyon do Rio Perdido, que drena o maciço da Bodoquena. BIGARELLA (1994), acusa o surgimento deste tipo de vale a rios com nascentes em zonas extracársticas, decorrentes de uma caudalosidade suficiente para cavar o canyon. Outro caso que pode, segundo o autor, originar canyons é quando estes tenham sido antigos rios subterrâneos e com o desmoronamento da abóbada das galerias, trouxe a descoberto a corrente dágua. No caso do Rio Perdido, estes fatores parecem ser estranhos, tendo todas suas nascentes dentro da área de litologias calcárias e nenhum indício de desmoronamentos. Levanta-se a hipótese de o desenvolvimento do seu canyon estar ligado exclusivamente à adaptação a direções tectônicas (linhas de falhas).
BIGARELLA (1994), descreve os mogotes de regiões cársticas tropicais com sendo morros residuais de formato cônico. Na região de Bonito, os mogotes apresentam-se com um formato convexo bastante suave (vide Foto 4.12.), quase sempre revelando a direção do mergulho das camadas, observada pela dissimetria das vertentes. São raros os mogotes que tenham um formato voltado para o cônico.
Na quadrícula pesquisada, sobre as litologias do Grupo Cuiabá, verifica-se que o relevo diferencia-se acentuadamente daqueles vales aplainados das Formações do Grupo Corumbá. A dissecação do relevo produziu formas onduladas, com vertentes côncavo-convexas e vales em "V", especialmente sobre as rochas filíticas, entremeados por morros residuais calcários (mogotes).
As rochas carbonáticas intemperizadas dão origem a solos com alto teor de fertilidade. Localmente tem-se, o desenvolvimento de vários tipos de solos, ligado diretamente à composição litológica, tanto fisica quanto quimicamente. Dentre os tipos ocorrentes, destaca-se a Terra Roxa Estruturada Similar eutrófica latossólica (vide Foto 4.1), o Brunizém Avermelhado (vide Foto 4.3), o Glei Húmico eutrófico vértico (vide Foto 4.4) e o Latossolo Vermelho-Escuro eutrófico (vide Foto 4.5) como os que melhor se prestam para a prática agrícola, devido ao sua maior profundidade e facilidade à mecanização. O solo Rendzina (vide Foto 4.2), apesar de ser descrito pelo Projeto RADAMBRASIL com seqüência de horizontes do tipo A e C, verificou-se a ocorrência de profundidades razoáveis para a mecanização. O Regossolo álico (vide Foto 4.6), desenvolvido sobre as litologias do Grupo Cuiabá, apresenta-se pouco profundo, podendo verificar afloramentos constante do material original, especialmente filitos, misturados em cascalheiras quartzosas.
Deve-se ressaltar que, via de regra, a profundidade dos solos sobre os mogotes é bem pequena, apresentando-se bastante pedregosos, com destaque para a presença de calhaus e matacões, fato observado durante os trabalhos de campo. Todavia, embora BIGARELLA (1994) descreva a ocorrência nas paisagens cársticas de mogotes totalmente desprovidos de solo e vegetação, no carste de Bonito não se tem registro de mogotes com essas características. Ao contrário, na região de Bonito, é sobre os mogotes que desenvolve uma vegetação exuberante, de porte florestal (vide Foto 4.13.), mesmo estes sendo de solos rasos e pedregosos.
Foto 4.13. Vista da vegetação sobre os mogotes (DIAS, 1998)
A principal propriedade do modelado cárstico, como descrito, é a predominância da drenagem subterrânea, dando origem aos chamados sumidouros e ressurgências. As águas que correm em superfície podem, abruptamente, passar a drenar subterraneamente, adentrando em canais abertos no interior do bloco calcário (sumidouros), dando origem ao "vale cego" e, a jusante, ressurgir, passando a correr em superfície novamente (ressurgências). Em muitos casos, este fato ocorre especialmente em épocas de deficiência hídrica, sendo que nas épocas chuvosas, voltam a ocupar o antigo vale seco, em virtude da saturação dos canais subterrâneos.
As taxas relativamente altas de precipitação na região por volta de 1.200 a 1.500 mm anuais vão contribuir, muito particularmente, para a predominância da drenagem superficial das áreas cársticas. O lençol subterrâneo é alimentado basicamente o ano todo, sofrendo de deficiência hídrica, apenas num curto período, o que implica no desaparecimento superficial de alguns trechos dos cursos de água menos caudalosos. Além disso, em muitos locais, o lençol freático da região apresenta-se pouco profundo, aflorando facilmente em épocas chuvosas. São encontradas extensas áreas de banhados, principalmente ao longo do Rio Formoso, facilmente visíveis em fotografias aéreas e imagens de satélite.
Não obstante, um exemplo bastante típico de drenagem subterrânea existente na região é o caso do Rio Perdido, que tem este nome devido adentrar-se em sumidouros passando a correr subterraneamente, e ressurgindo novamente a jusante. Muitos outros pequenos exemplos podem ser arrolados na região, apresentando o fenômeno. Mas o fato que mais impressiona são as nascentes de alguns rios, como o Rio Sucuri, que são verdadeiras ressurgências, nas quais as águas brotam caudalosamente, com aspecto extremamente cristalino. Estas ocorrem, na região, geralmente nas porções mais rebaixadas do terreno, indicando serem águas que percolaram grandes distâncias no interior do bloco calcário. A cristalinidade das águas é explicada pelo fato de ser o calcário uma rocha solúvel, não transportando materiais em suspensão, os quais dão coloração à água.
KOHLER (1989), destaca a importância dos estudos do sistema hídrico das regiões cársticas, visto suas peculiaridades. Face ao cataclasamento e brechamento das rochas calcárias e à circulação das águas em subsuperfície, estas funcionam como reservatórios hídricos subterrâneos, criando áreas de recarga e áreas de descarga. De acordo com o autor, as áreas de recarga devem ser preservadas, evitando a contaminação dos aqüíferos e, as áreas de descarga, que coincidem com as planícies e nascentes, devem permanecer intocadas, com o intuito de evitar a erosão acelerada.
As altas taxas de pluviosidade da região, aliadas ao alto teor de fertilidade dos solos calcários, favorecem o aparecimento de um manto florestal bastante expressivo, recobrindo a Serra Bodoquena. Esta característica realça a diferenciação das paisagens que imperam na Bodoquena cárstica, comparada ao contexto regional. Desenvolve-se a Floresta Estacional Decidual (Floresta Submontana) e Cerrados (Áreas de Tensão Ecológica). Os trabalhos de campo permitiram averiguar e confirmar que a distribuição das formações vegetais estão diretamente associadas às diferenciações lito-pedológicas. Desconsiderando as áreas totalmente devastadas pelo agente antrópico, a ocorrência de formações florestais (Floresta Estacional Decidual) estão, regra geral, sobre as litologias calcárias do Grupo Corumbá. Por outro lado, naquelas áreas onde afloram as litologias do Grupo Cuiabá e dos arenitos da Formação Aquidauana, encontram-se os cerrados (Áreas de Tensão Ecológica) (vide Foto 4.14.).
Foto 4.14. Vista de uma porção de Cerrado sobre o Grupo Cuiabá (DIAS, 1998)
Para uma melhor apreensão da estrutura vegetal descrita, remeta-se ao item 4.2.2.1., que trata da cartografia da vegetação através da técnica de pirâmides.
A ocupação antrópica desfigurou grande parte das paisagens originais da região, criando um complexo mosaico paisagístico. Hoje, as paisagens da região de Bonito são um misto de áreas completamente desprovidas de vegetação natural convivendo lado a lado com áreas intocadas. As primeiras referem-se aos vales aplainados e as segundas, aos mogotes (vide Foto 4.13.).
As porções mais elevadas da Serra da Bodoquena desfrutam de um grande maciço florestal, conservado, principalmente, pelo fato de estar sobre um relevo acidentado, o que acaba por dificultar o uso para outros fins. Nem por isso, acredita-se que esta não esteja fora de riscos, caso não haja uma presença sistemática dos órgãos defesa ambiental. Considera-se que, pelas suas características tanto florísticas, quanto pelas características de sua estrutura lito-pedológica, esta porção deve ser destinada à preservação permanente.
As porções de cerrado (Áreas de Tensão Ecológica), consideradas de transição entre formações vegetais, por suas características florísticas, acabam sendo alvo de uma ação antrópica mais intensa, seja pela concepção errônea de aparente "pobreza" das espécies florestais (predomínio de arbustos e espécies herbáceas), portanto trocando-as por pastagens artificiais ou utilizando-o como pastagem natural, sendo, também, o primeiro passo para a exclusão deste. Este fato foi comprovado quando dos estudos fitossociológicos realizados na região, que apontam para uma tendência a seu desaparecimento.
A alta fertilidade dos solos atraiu, nos últimos anos, agricultores de forma rápida e intensiva para a região, caracterizando-a como uma das fronteiras agrícolas mais recentes do Estado de Mato Grosso do Sul (CATTANIO et alii, 1993). Este tipo de exploração demonstra sérios riscos para o ambiente, uma vez que a circulação subterrânea, facilita a contaminação dos lençóis aqüíferos, quando da utilização de agrotóxicos. CATTANIO et alii (1993) sugerem a exclusão de tal prática nas regiões calcárias. Além disso, a implantação dos agrossistemas implica na retirada de grandes massas vegetais, condição imprescindível para a proteção contra os processos erosivos e perda de solos. O processo inverso pode desencadear uma série de fenômenos degradativos ao ambiente.
Os grandes vales aplainados são os locais destinados ao cultivo de cereais, em especial a soja, ou como pastagens artificiais, visto a facilidade de mecanização.
O calcário é explorado também como matéria-prima para a construção civil, seja como brita ou para a fabricação de cimento e cal; é utilizado como corretivo de solos ácidos, após passar por um processo de moagem e, além disso, da extração do mármore o calcário metamorfizado. A exploração econômica, neste sentido, é potencialmente atrativa.
A beleza cênica revelada pelas formas criadas pelo processo de carstificação das rochas calcárias, tem despertado o turismo como uma nova fonte de renda para a região, especialmente para o município de Bonito, o que implica numa outra ameaça à fragilidade do equilíbrio geoecológico do ambiente.
A região de Bonito é famosa pelas suas grutas, pelos rios e nascentes cristalinos e pelas inúmeras cachoeiras (vide Foto 4.15.). Dezenas de grutas ou cavernas ocorrem na região de Bonito. Porém, apenas 2 delas merecem destaque: a Gruta do Lago Azul e a Gruta Nossa Senhora Aparecida.
Foto 4.15. Vista de uma das cachoeiras da região de Bonito (DIAS, 1998)
A Gruta do Lagoa Azul constitui o ponto turístico mais visitado da região (vide Foto 4.16.). A origem de seu nome está na virtual coloração de suas águas muito cristalinas, diante da penetração da luz solar. Esta gruta não dispõe de grande quantidade e nem de um grande desenvolvimento de espeleotemas, o que indica a sua pouca idade e também a composição mais dolomítica. Esta gruta diferencia-se das outras ocorrentes na região pela profundidade (ainda muito especulada) e por apresentar água no seu interior. Equipes de pesquisadores constataram poucos indícios de vida nas águas: encontraram recentemente apenas uma espécie de camarão albino desconhecido. A Gruta Nossa Senhora Aparecida é conhecida pela sua imensa quantidade de espeleotemas, muito superior à da Gruta do Lago Azul, porém sem água no seu interior. Hoje esta gruta encontra-se interditada para a visitação turística, devido à depredação e a riscos de desabamento.
Foto 4.16. Vista interna da Gruta do Lago Azul (LEO, M.C., 1997)
Os rios Formoso, Mimoso e Sucuri são os principais em termos de beleza, representados pelas suas majestosas cachoeiras de águas cristalinas e peixes, com destaque para as cachoeiras do rio Mimoso. Algumas nascente (em ressurgências) representam pontos de beleza incomparável, como o chamado Aquário (Baia Bonita), a Lagoa Misteriosa, o Rio Sucuri (vide Foto 4.17.) etc.
Foto 4.17. Nascente do Rio Sucuri (ressurgência) (DIAS, 1998)
Neste contexto, entende-se que a região cárstica de Bonito, apresenta-se como uma área em que as fragilidades aos processos de depauperação ambiental, são evidentes, frente a uma ocupação e exploração desordenada. Considera-se, por esta razão, ponto primordial a realização de inventários completos, visando conhecer o teor da fragilidade e das potencialidades geoecológicas dos geossistemas calcários/cársticos regionais e a posterior realização de planejamentos de ocupação e exploração sustentáveis, capazes de estabelecer uma harmonia entre as necessidades da sociedade e as da natureza. Todavia, a ocupação da região da Serra da Bodoquena, tem acontecido há tempos e de forma maciça, o que sugere a ausência de planejamentos condizentes, já que a legislação ambiental no Brasil, tem datação recente. Aliado a isso, a dificuldade da criação de uma consciência ecológica autêntica nos seus ocupantes, expressa os riscos a que a região cárstica de Bonito está submetida.
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